Vive-se a “tempestade perfeita” na hotelaria de Fátima
Com uma dependência de 70% de visitantes de mercados internacionais, a hotelaria de Fátima olha agora para o mercado interno alargado na retoma da atividade turística
Carina Monteiro
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Com uma dependência de 70% de visitantes de mercados internacionais, a hotelaria de Fátima vive “uma tempestade perfeita”, como declarou Alexandre Marto Pereira, CEO do grupo hoteleiro Fátima Hotels, na web conferência “Centro: Preparar o futuro”, organizada pelo Publituris, com o apoio da Turismo Centro de Portugal.
Os efeitos da COVID-19 começaram a sentir-se logo no início do ano, com o cancelamento de reservas dos mercados asiáticos, sobretudo da Coreia do Sul, um mercado importante para Fátima. Na análise de Alexandre Marto Pereira, os mercados extraeuropeus serão os que voltarão ao destino mais tarde. Para já é preciso olhar para o mercado interno alargado.
“Os mercados internacionais, principalmente os extraeuropeus, não vão arrancar tão cedo. Não tenho esperança que haja qualquer tipo de operação durante os próximos meses, e, muito provavelmente, até durante este ano. O que estamos a observar é o cancelamento de todas as reservas até ao final do ano, principalmente das origens mais longínquas”, começa por dizer.
Analisando o perfil dos visitantes de Fátima: sobretudo estrangeiros, que viajam em grupo e de uma faixa etária elevada, Alexandre Marto Pereira considera que estão reunidas todas as condições para a operação “correr mal este ano”. Acresce, ainda, a aposta que foi feita nos últimos anos em mercados como o asiático, o Brasil e os EUA. “Esta é uma tempestade perfeita. No nosso caso, temos uma exposição extraordinária à Ásia e a Ásia implodiu porque a COVID- 19 surgiu ali. Temos uma exposição extraordinária à América do Sul, principalmente ao Brasil, e o país também está um caos. Nos EUA, estivemos a trabalhar durante anos para desenvolver o mercado norte americano e agora está a esfumar-se. E depois a Europa, principalmente os mercados mais importantes para todo o Centro. Isto é mesmo um pesadelo”.
Apesar das perspetivas nada animadoras, sobretudo para o decorrer de 2020, o responsável do grupo hoteleiro vislumbra uma luz ao fundo do túnel. “Penso que Fátima pode adaptar-se, porque tem algumas forças. Em primeiro lugar, apesar de termos 70% de clientes internacionais, cerca de 50% é do mercado interno alargado, ou seja, Portugal e Espanha. Temos de apostar primeiro no mercado português e logo a seguir no espanhol. Esperemos que possam vir alguns espanhóis este verão. Em segundo lugar, porque as unidades hoteleiras são, ainda na sua grande maioria, unidades familiares, e, portanto, têm de trabalhar na comunicação e perceção de que são pequenas unidades seguras e familiares. Depois, acreditamos que os voos possam regressar em setembro, outubro, novembro com uma parte da operação internacional que foi perdida, primeiro a nível europeu, e só mais à frente com os mercados extraeuropeus”.
Promoção nos mercados extraeuropeus “não pode ser abandonada”
Ainda que só faça sentido olhar para os mercados extraeuropeus no próximo ano, Alexandre Marto Pereira acredita que o mercado asiático pode constituir mais à frente uma oportunidade para a retoma. Isto porque, defende, os países asiáticos serão os que sofrerão menos a recessão económica. “Alguns nem terão impacto a nível de recessão. Esses países também vão arrancar mais depressa com o turismo. Primeiro, naquela região, mas logo depois a procura pela Europa vai retomar. Esses mercados não podem ser abandonados. No próximo ano ou até no final deste ano temos de considerar as economias que foram mais resistentes, porque o mercado interno europeu terá a confiança restabelecida, mas vai ter uma fragilidade enorme, principalmente os mercados mais importantes para o Centro, nomeadamente Espanha e Itália, vão ter recessões tão fortes, que temo que não seja suficiente para a retoma”.
A decisão de abertura dos hotéis da rede Fátima Hotels vai caber a cada um dos proprietários. O facto de ser uma hotelaria “muito familiar” é entendida como uma mais-valia nesta fase. “As decisões vão ser feitas pelos hotéis individualmente, pelas famílias, e isso é uma força enorme que a hotelaria de Fátima e do Centro têm. É uma hotelaria muito familiar, embora tenha criado inúmeros postos de trabalho nos últimos anos, porque só com pessoas é que se aumenta a qualidade e porque a dimensão também tem aumentado, apesar de tudo a grande maioria das unidades é muito resiliente, porque o núcleo da gestão é a família”. Mas para que possam reabrir, Alexandre Marto Pereira defende que haja uma flexibilização em medidas como o lay off. “Se conseguirmos manter o emprego não tendo o custo total de o suportar, isso significa que as unidades podem adaptar-se observando o pickup diário, é necessário sem duvida flexibilizar as regras do lay off por forma a permitir colocar e retirar pessoas do lay off com alguma flexibilidade e rapidez. Estas unidades podem continuar a vender se funcionaram em grupo e até podem apoiar-se mutuamente, no sentido de manter montras de venda e depois transferirem hóspedes, eventualmente dando upgrades dentro da rede. Com alguns hóspedes, um hotel já consegue libertar o cash flow suficiente para suportar os custos variáveis, não significa que a operação é rentável, significa apenas que os motores podem voltar a ligar-se e o hotel pode começar a trabalhar”.
Na opinião de Alexandre Marto Pereira, quando o mercado interno arrancar, os hotéis “paulatinamente vão reabrir, apesar do prejuízo”. “A catástrofe vai surgir mais à frente, caso os empréstimos que a hotelaria e as empresas estão agora a fazer não sejam chutados mais para a frente. Julgo que é essencial o Governo transformar estes créditos a curto prazo ou de tesouraria às empresas de turismo em créditos de longo prazo, que pudessem ser diluídos nos próximos 15, 20 anos como uma espécie de dívida de guerra”.
Como atravessar o deserto que se avizinha este ano, reduzindo custos, mas mantendo a qualidade e introduzindo novas funções de segurança é a grande questão. “Não há uma resposta fácil. Sou muito liberal, mas esta é uma situação de catástrofe, de guerra, e é nestes momentos que o Estado deve intervir. Sinceramente, não vejo como é que uma boa parte do tecido empresarial do turismo em Portugal pode sobreviver sem uma forte intervenção do Estado”, considera.
O responsável do Grupo Fátima Hotels encontra algumas oportunidades nas unidades de nicho, nos hotéis mais horizontais, de baixa densidade e em locais mais isolados. “Os hotéis que eram antes os patinhos feios da hotelaria, agora são o contrário. Mesmo na nossa rede, temos o Luz Houses, também de uma família, que é um hotel horizontal, pequeno, com os quartos distribuídos, esses hotéis vão ter uma grande oportunidade. Para o resto da hotelaria, sinceramente, à parte de tudo o que podemos fazer quanto à redução de custos e acima de tudo tentar comunicar que somos hotéis sem risco, como dizia um operador brasileiro, estamos a ter uma posição de tartaruga: estou lá dentro, esperando que passe.”
Até há pouco tempo, os hotéis em Fátima tinham reservas para o 13 de maio, mas a decisão das celebrações não contarem com peregrinos este ano não apanhou Alexandre Marto Pereira de surpresa. “Até há poucas semanas, o 13 de maio mantinha os hotéis com muitas reservas, apesar de não termos incentivado essas reservas, porque já adivinhámos que esta decisão da Igreja Católica se faria, porque era inevitável. Até há poucos dias temos vindo a contactar as reservas para as cancelar”.