Histórias do Turismo | Aeroporto de Lisboa: O primeiro projecto
Por Jorge Mangorrinha, Investigador em História do Turismo.
Publituris
TAAG retoma este ano voos entre Luanda e Praia, via São Tomé
Miradouro do Zebro é nova atração turística no concelho de Oleiros
Faturação dos estabelecimentos hoteleiros em Portugal ultrapassou os 6MM€ em 2023
Portugueses realizaram 23,7 milhões de viagens em 2023
Allianz Partners regista crescimento em todos os segmentos de negócio
Azul celebra mais de 191 mil passageiros no primeiro aniversário da rota para Paris
Octant Hotels promove-se nos EUA
“A promoção na Europa não pode ser só Macau”
APAVT destaca “papel principal” da associação na promoção de Macau no mercado europeu
Comitiva portuguesa visita MITE a convite da APAVT
Por Jorge Mangorrinha, Investigador em História do Turismo
Há um século, Gago Coutinho e Sacadura Cabral e Sarmento de Beires e Brito Pais já preparavam dois feitos históricos da aviação portuguesa, concretizados pouco tempo depois. Os dois primeiros, em 1922, com a primeira travessia do Atlântico Sul (Lisboa-Rio de Janeiro) e os dois segundos, em 1924, com a primeira ligação área entre o Portugal europeu e Macau, depois de sobrevoarem o norte de África e atravessarem a Península do Indostão. O empenho português, que caracterizou estas duas expedições pioneiras, talvez tivesse acelerado o interesse pela aviação comercial, mas ainda assim, em 1928, a Madeira e os Açores receberam o primeiro cruzeiro marítimo com partida de Lisboa, organizado pela Sociedade Propaganda de Portugal, o único meio no sentido de atrair os continentais.
Nos anos 30, finalmente, iniciar-se-ia o ciclo da aviação comercial, e os Serviços Aéreos de Portugal, com sede em Lisboa, passariam a utilizar o Campo Internacional de Aterragem, em Alverca (1919-1940). Os voos transatlânticos entre a Europa e a América eram feitos em hidroaviões por motivos de segurança. Só depois de atravessarem o Atlântico os passageiros mudavam para aviões com base terrestre que os levavam ao seu destino final. Lisboa era o terminal ideal do lado europeu e o Governo Português entendeu transformar a capital numa grande plataforma aérea para voos internacionais. Para isso, foram projectados dois aeroportos: um marítimo, para hidroaviões, e outro terrestre, para aviões convencionais. Este último seria inaugurado a 18 de Outubro de 1942, um dia depois da sua abertura.
As opções para a sua localização passaram pelos terrenos da futura Alameda Universitária, no Campo Grande, ou na Portela. Neste debate, houve opiniões que consideravam que a possibilidade de instalar um aeroporto na Portela seria megalómana, pela distância à cidade de Lisboa, preferindo a primeira opção. Foi o caso do Ministro da Guerra, Passos e Sousa, que indicara em 1927 os terrenos do Jockey Club, que saíra recentemente do expropriado Hipódromo de Sete Rios. Por essa altura, assistiu-se aí a um episódio de aterragem de dois aviões militares tripulados pelo major Ribeiro da Fonseca e pelo capitão Pais Ramos. A vontade destes e de outros aviadores era viabilizar uma solução alternativa e mais próxima de Lisboa, em vez dos campos de aterragem da Granja do Marquês, em Sintra, e de Alverca, localizações ainda em discussão.
A decisão do Governo e da Câmara Municipal de Lisboa foi, porém, pelos terrenos da Portela, antecedida de uma subscrição pública, a favor desta opção, liderada pelo comandante Quirino da Fonseca (1928). Vários pontos contribuíram para tal: encontrar-se, virtualmente, “fora de portas”; situar-se a curta distância do centro da cidade e conter regime topográfico do tipo planáltico, uma direcção de ventos dominantes e proximidade à orla fluvial.
A opção pela Portela terá, assim, influenciado a Société d’Études des Aéroports Internationaux du Portugal, com sede em Paris e sucursal em Lisboa, que apresentou, precisamente no ano da decisão (1928), um anteprojecto para a criação, nesse local, de um aeroporto comercial terrestre. A concepção técnica coube à empresa de arquitectos e engenheiros franceses R. Pons & A. Spazzini, com escritório no número 27 da Avenue Victor Emmanuel III, em Paris. Com uma carta datada de 23 de Julho de 1928, que a Société d’Études dirigiu à Câmara Municipal, foram anexados um relatório sobre a escolha dos terrenos e uma exposição das bases gerais de um contrato, mediante o qual a empresa se propunha levar a efeito e custear o conjunto de construções e instalações do novo aeroporto, a tempo de servir a Exposição do Mundo Português (1940).
Nesses documentos, os promotores defendem a escolha dos terrenos da Portela, já que à sua análise presidiu “tão somente” o critério técnico dos seus administradores: “engenheiros diplomados por escolas de renome mundial, e, além disso, antigos aviadores militares, com larga folha de serviços no exército francês. Para evitar sugestões de qualquer natureza, o exame prévio dos terrenos propostos, em Lisboa, para a criação do seu aeroporto comercial terrestre, foi feito sem consulta alguma preliminar a qualquer entidade, quer pertencente à muita distinta Aviação Militar Portuguesa, quer pertencente à Exma. Câmara de Lisboa, ou mesmo ao Ministério do Comércio. Desta forma, a nossa escolha recaiu imparcialmente sobre aqueles terrenos que, ao nosso critério, nos pareceram tecnicamente mais apropriados ao fim em vista, e podendo melhor e mais seguramente servir, ao mesmo tempo, a cidade de Lisboa e os legítimos interesses das Companhias transportadoras, que serão os únicos e futuros clientes do aeroporto comercial, que se pretende criar.”
O conceito passou pela ampliação progressiva das instalações, “sem prejuízo da orientação de certa grandiosidade e largueza de vistas que cumpria imprimir ao plano geral desta obra, que, de forma alguma, se poderia adaptar a um critério estreito e acanhado, só prejudicial, no presente como no futuro.”
O estudo prevê um desenho de pistas em cruz, com o apoio de um conjunto edificado: o edifício central para logística e administração, os hangares e as oficinas de reparação, e outros edifícios anexos.
No projecto do edifício central de dois pisos, dispõem-se em hemiciclo os serviços administrativos e técnicos, os escritórios das diferentes companhias aéreas e as zonas de acesso dos passageiros aos aviões, em torno de um grande átrio público, no centro do qual existe um pátio ajardinado. Em termos de zonas comerciais, a proposta da equipa francesa cinge-se a dois quiosques para a venda de jornais e tabaco, localizados no centro do grande hemiciclo do corpo central. Os espaços comerciais nos grandes aeroportos internacionais eram ainda reduzidos, apesar de ser precisamente desta época a instalação do primeiro “Free Shop”, no Aeroporto de Amesterdão. À esquerda desse edifício, liga-se um corpo de três pisos previsto para unidade hoteleira (cujo último piso seria construído posteriormente com o aumento do tráfego), com quartos para a tripulação e para os passageiros, todos com instalação sanitária privativa. Nas áreas comuns, possui um “buffet” no piso térreo e um grande restaurante para 220 pessoas e casa de chá, ambos de acesso aos terraços com vista para o campo de aterragem.
Estão contemplados, ainda, os pequenos alojamentos e cantina para o pessoal de serviço, posto médico sanitário, posto de socorros e incêndios, pavilhão para uso do Aero Club, reservatórios subterrâneos de carburantes, reservatório de água, posto rádio-telegráfico e pequenas moradias dispersas para o pessoal do aeroporto.
Este projecto representa um programa-base diferente do que aquele que viria a ser projectado pela equipa de engenheiros e arquitectos para o aeroporto construído (1938-1940). Coincidindo na localização definitiva do aeroporto, contudo, podemos especular acerca do motivo pelo qual a proposta arquitectónica francesa para Lisboa não vingou. A equipa passou a ser portuguesa, chefiada pelo arquitecto Francisco Keil do Amaral. Ficaram os textos e os desenhos do projecto francês, cujo conhecimento público é inexistente ou escasso e, portanto, com parte deles ilustramos este texto, em resultado da nossa procura nas fontes documentais.