Cabo Verde precisa de diversificar o turismo ainda muito baseado no sol e praia e no ‘all inclusive’
O Programa Operacional do Turismo de Cabo Verde (POT 2022-2026), orçado em cerca de 200 milhões de euros e já aprovado pelo governo preconiza nova estratégia: diversificação de produtos e mercados, desconcentração do turismo pelas diferentes ilhas, e melhoria da conectividade, revelou o administrador do Instituto do Turismo de Cabo Verde (ITCV), Francisco Martins.

Carolina Morgado
O turismo em Cabo Verde não foi exceção. A pandemia causou um forte impacto no setor económico mais importante para o país, e que representa mais de 25% do PIB. Em 2019, o seu melhor ano de sempre, o destino acolheu 820 mil visitantes internacionais, mas o Covid-19 viria obrigar a um decréscimo de cerca de 75%.
Em entrevista concedida ao Publituris, o administrador do Instituto do Turismo de Cabo Verde (ITCV), Francisco Martins assegurou que “o governo esteve muito bem porque a retoma dependia muito daquilo que eram as decisões necessárias a tomar para manter a segurança sanitária do país”.
Assim, “conseguimos implementar um plano de vacinação, diria excecional, com uma taxa em algumas ilhas a ultrapassar os 90%, e hoje em dia temos uma taxa das mais altas em África”, avançou.
Tendo dado essa resposta em termos de segurança sanitária, disse ainda, “conseguimos rapidamente que o nosso principal mercado emissor, o Reino Unido, tirasse Cabo Verde da Lista Vermelha, e começámos a ter procura, e agora, com um enorme crescimento não só dos britânicos como do próprio mercado português que no verão teve uma procura altíssima principalmente no último agosto”.
Na opinião de Francisco Martins “a retoma está a correr bem, temos novos mercados a chegarem a Cabo Verde sobretudo da Europa de Leste – Polónia, República Checa e Hungria. Há já um conhecimento no exterior do destino de uma forma positiva. É verdade que continuamos a depender muito do mercado europeu, nomeadamente da Europa Ocidental – Reino Unido, Alemanha, França, Portugal, Espanha, Países Baixos, mas o objetivo agora é aproveitar esta retoma, aproveitar que Cabo Verde consegue garantir segurança não só ao nível da proteção de pessoas e bens, mas também sanitária (indicador que se tornou importante) para aliciar novos mercados e diversificar o turismo que está muito baseado no sol e praia e no sistema all inclusive”.
A retoma está a correr bem, temos novos mercados a chegarem a Cabo Verde sobretudo da Europa de Leste – Polónia, República Checa e Hungria. Há já um conhecimento no exterior do destino de uma forma positiva
Linhas mestras do POT 2022-2026
Estas são, aliás, as linhas mestras que norteiam o Programa Operacional do Turismo de Cabo Verde (POT 2022-2026) aprovado pelo governo e orçado em cerca de 200 milhões de euros. Conforme explicou o administrador do ITCV, nesta primeira fase, que já começou a ser implementada, vão ser investidos cerca de 80 milhões de euros, parte do empréstimo do Banco Mundial e parte do governo através do Fundo do Turismo.
Á luz deste programa “vamos investir muito na requalificação das localidades, na melhoria dos acessos, no desenvolvimento e melhoria da conetividade e focar no turismo ligado à natureza”, apontou, adiantando que “Sal e Boa Vista são destinos já conhecidos e consolidados, mas temos outras ilhas que podem oferecer muito daquilo que é procurado ao nível do trekking, do trailing e caminhadas. Neste caso estou a falar das ilhas de Santo Antão, São Nicolau, Santiago, Fogo e Brava”.
Segundo o responsável, “o desenvolvimento do turismo cultural e de eventos é uma aposta para São Vicente que tem esta vocação natural e que, no fundo, está a conseguir dar resposta com uma procura grande de investidores que querem construir novos hotéis na ilha. Até final deste ano vamos duplicar o número de camas, passando a totalizar mais de 2.500, estamos a construir o Terminal de Cruzeiros em São Vicente que vai ficar concluído dentro de um ano. O governo também já anunciou a construção do aeroporto em Santo Antão, tudo isto para permitir que Cabo Verde possa atrair novos mercados, nomeadamente, na América Latina, América do Norte, na Europa de Leste e no continente africano. Detetámos é que o país pode aproveitar melhor o mercado regional, que está a hora e meia de distância de avião”.
Neste sentido, resumiu Francisco Martins, “a diversificação de produtos e mercados, desconcentração do turismo pelas diferentes ilhas, e melhoria da conectividade para permitir que qualquer pessoa que visita Cabo Verde e em qualquer uma das ilhas pode, rapidamente, se precisar, sair para o seu destino de origem”, são as grandes apostas do POT.
Melhor a conectividade é fundamental
Defendeu que esta questão da conectividade “não é uma publicidade, é um facto e já está a ser implementado. Estamos a trabalhar com várias companhias aéreas europeias para ver se é possível ter voos a custos mais atrativos ou mesmo low cost”. Lembrou que a Vueling ligou Barcelona à ilha do Sal no verão passado, e vai retomar na época alta, e “várias outras empresas aéreas estão alinhadas neste propósito”.
Além disso, garantiu que “estamos a trabalhar para criar condições para que a Cabo Verde Airlines retome os destinos habituais que eram Boston, Brasil e o continente africano. Temos ligações para Lisboa, mas a partir de julho pretendemos retomar Boston e, eventualmente, algumas cidades brasileiras, como é o caso de Fortaleza, que já era uma rota bastante conhecida e que permitia um fluxo da Europa para o Brasil e vice-versa, com stopover em Cabo Verde para uns dias de férias em condições atrativas”.
Pela sua importância no desenvolvimento económico a estratégia do governo de Cabo Verde sustenta no turismo, mas não só. O administrador referiu que devido à própria localização geográfica do país “queremos que seja também uma plataforma de serviços a nível digital, de fornecimento de serviços, e de realização de provas ligadas aos desportos náuticos, pois como se sabe, Cabo Verde tem-se desenvolvido muito ao nível do kitesurf com vários campeões mundiais”.
Estamos a trabalhar com várias companhias aéreas europeias para ver se é possível ter voos a custos mais atrativos ou mesmo as low cost
Cultura como complemento do turismo
No que diz respeito à cultura, Francisco Martins considerou que vai passar “por uma forte aposta no nosso Carnaval de São Vicente, produto já bastante conhecido, e também em outras manifestações culturais”, para lembrar que Cabo Verde “tem grandes escritores, artesanato, teatro, cinema e o seu DNA mais conhecido que é a música, que podem ser complementos ao turismo”.
Igualmente, pretende-se “dinamizar mais um elemento valioso – a Cidade Velha, distinguida pela UNESCO como património mundial da humanidade, portanto são elementos que, trabalhados a nível de valorização do património cultural construído e do imaterial podem levar a que Cabo Verde seja um destino multifacetado”, sustentou.
O Instituto do Turismo de Cabo Verde é responsável pela promoção do destino no exterior, regulação e fiscalização. A área de promoção e captação do investimento é gerida pela Cabo Verde Trade Invest, mas “obviamente é um trabalho que tem de ser feito de uma forma articulada, porque uma coisa leva à outra. Há essa intenção de podermos estar em vários eventos e destinos em simultâneo para criar mais sinergias e potenciar as presenças”.
Balanço positivo da BTL
“O mercado português é muito importante, é o que tem mais força no verão em Cabo Verde e aprecia o destino também pela nossa ligação histórica e cultural”, destacou o nosso entrevistado, que apela também aos cabo-verdianos residentes em Portugal que vejam Cabo Verde não só como destino de férias, mas também de investimento. Nesse sentido, “estamos também muito focados na promoção do nosso país junto da diáspora que é enorme não só em Portugal como em vários países europeus e do mundo”. Este foi também um dos objetivos da presença de Cabo Verde na BTL.
“A nossa presença em feiras será de forma estruturada e bem planeada. É um elemento importante para a promoção, mas a nossa aposta vai ser marketing digital. Com alguns parceiros, inclusivamente com o Turismo de Portugal, fazer um maior investimento no marketing digital para que, a partir de Cabo Verde, e via as plataformas digitais, possamos chegar a todo o mundo”, disse.
Por outro lado, “queremos desenvolver um novo nicho de mercado – nómadas digitais. Lançámos o programa Remote Working Cabo Verde e, está em vias de aprovação o visto de trabalho remoto, o mesmo que muitos países europeus estão a fazer, inclusive Portugal.
Entretanto, de regresso ao seu país, o administrador ITCV, fez um balanço “muito positivo” da participação do destino na Bolsa de Turismo de Lisboa, que decorreu de 01 a 05 de março.
À imprensa cabo-verdiana, Francisco Martins disse que foi possível dar a conhecer ainda mais o destino Cabo Verde, uma vez que que os próprios turistas que visitaram o ‘stand’ ficavam a questionar sobre as outras ilhas, para além de Sal e Boa Vista, como Santiago, São Vicente, Santo Antão ou Fogo.
“O balanço que fazemos da participação de Cabo Verde na Bolsa de Turismo de Lisboa é muito positivo. Os próprios operadores cabo-verdianos que participaram ficaram muito satisfeitos com os resultados”, afirmou o administrador.