A “vingança” dos viajantes
Chegado o verão, os turistas estão prontos para se “vingarem” e há que ir ao encontro das suas necessidades e exigências. Uma análise da McKinsey revela as quatro prioridades a ter em conta para a retoma da indústria das viagens.

Victor Jorge
“Podemos estar no limiar de uma nova era nas viagens”, isto se tudo correr pela positiva, afirma um recente relatório da McKinsey, afirmando a consultora que, embora as variantes da COVID-19 possam afetar as condições, “parece apenas uma questão de tempo até que os viajantes nalgumas partes do mundo voltem aos céus, graças ao aumento das taxas de vacinação e ao administrável número de casos”.
Com os piores efeitos da pandemia COVID-19 a desvanecerem-se, a maioria dos indicadores aponta para um regresso das viagens – como “vingança” – à medida que as pessoas procuram reconectar-se, explorar novos destinos ou revisitar locais favoritos e confiáveis. “Muitos querem apenas fugir do confinamento das suas casas”, admite a pesquisa da McKinsey, revelando que viajar é a segunda atividade mais desejada entre os inquiridos (em primeiro lugar: jantar fora).
Nos Estados Unidos, por exemplo, as viagens aéreas atingiram dois milhões de passageiros diários, mais perto do nível pré-pandêmico de cerca de 2,5 milhões do que da mínima de cerca de 90.000, em abril de 2020, enquanto as reservas de hotéis e aluguer de carros regista aumentos consistentes.
Contudo, as empresas mal preparadas podem vir a enfrentar a ira de um grupo de turistas focados no lazer que já se encontram a lutar para acompanhar os novos protocolos de viagens. “Se a indústria não trabalhar agora para aumentar a capacidade, o ecossistema pode ceder sob pressão, forçando os viajantes a suportar longos tempos de espera e preços inflacionados”, admite a McKinsey.
Assim, existem duas trajetórias de como as viagens provavelmente irão recuperar, comparando países que têm quase zero casos com aqueles que têm mais casos, mas geríeis, e taxas de vacinação mais altas. Em ambos os cenários, “a indústria das viagens que não prepara para o próximo fluxo de viajantes, corre o risco de perder uma oportunidade valiosa de recuperar as perdas incorridas durante o auge da pandemia”, considera a consultora. Por outro lado, acreditam os responsáveis pelo estudo, será necessário um foco quatro áreas: “capacitação, investimento em inovação digital, rever abordagens comerciais e aprender com momentos críticos”.
“Para onde quer que se olhe no mundo, existem pessoas ansiosas para viajar”, salienta a McKinsey, admitindo a consultora que “as viagens de lazer liderarão a recuperação, seguidas das viagens corporativas”. Por isso, é expectável um aumento nas viagens em (e entre) países com números de casos COVID-19 controlados e com acesso à vacina, indicando a consultora que “essas regiões estão dispostas a aceitar o aumento do número de casos, desde que as taxas de mortalidade e hospitalização permaneçam baixas”.
Apesar dos sinais promissores, a indústria do turismo, provavelmente, terá dificuldades em capitalizar o aumento iminente da procura por viagens, especialmente na Europa e nos EUA. “De companhias aéreas e rent-a-cars a hotéis e restaurantes em aeroportos, toda a cadeia de abastecimento já está a mostrar sinais de tensão”, considera a McKinsey. Aqui ficam as quatro prioridades para o futuro do universo das viagens:
1. Recuperar a capacidade
O imperativo mais urgente para todas as empresas na cadeia de abastecimento no universo das viagens, é trazer de volta a capacidade outrora existente ou, pelo menos, garantir que sejam capazes de fazê-lo. Muitos trabalhadores contratados e temporários na indústria de restaurantes que foram demitidos durante a pandemia encontraram outro emprego e estão relutantes em voltar aos seus empregos anteriores, resultando numa crise de mão-de-obra. No Reino Unido, por exemplo, mais de um em cada dez trabalhadores deixou o setor da hospitalidade no ano passado. Nos Estados Unidos, ainda havia um déficit em abril de cerca de dois milhões de empregos em lazer e hospitalidade – muito maior do que antes da pandemia. Os níveis de capacidade da aviação global ainda estão bem abaixo dos níveis pré-pandêmicos, visto que muitos aviões permanecem parados e as equipas dispensadas.
Assim, uma das prioridades, apesar de “reativar pilotos de companhias aéreas e tripulações de cabine, preparar aeronaves em solo para o serviço e recontratar e treinar pessoal de serviço possa ser caro, o custo de ficar parado e não fazer nada seria mais alto”, acredita a McKinsey.
2. Investir de forma inovadora para melhorar toda a jornada do cliente
Uma área tornada vital para as operações foram as operações digitais. “Lembre-se de que a experiência do cliente é moldada em toda a jornada de ponta a ponta, desde a reserva até a viagem e o retorno para casa”, sugerem os autores desta análise. Mesmo os viajantes mais experientes terão que se adaptar a novos protocolos, precisam de mais, e não menos, assistência. Além disso, certas viagens e momentos críticos – como férias em família, uma viagem de negócios importante ou uma emergência de última hora – têm um peso desproporcional na mente dos consumidores quando planeiam a sua próxima viagem. O volume de tráfego previsto durante o verão e os períodos de pico das férias apenas agravará esses problemas e trará maiores inconvenientes ao sistema como um todo.
“A indústria precisa garantir que os processos de reabertura sejam tranquilos e que a assistência adequada esteja disponível para os viajantes para ajudá-los a adaptarem-se a novas formas de viajar”, refere a McKinsey. Por isso, é provável que viagens internacionais precisem de documentação adicional e que esses requisitos variem de acordo com o país e, potencialmente, com o centro de trânsito.
Como atestam os longos tempos de espera nos postos de controlo dos aeroportos, navegar manualmente por essas complexidades no balcão de check-in é altamente ineficiente e sujeito a erros humanos. Alguns aeroportos estão a testar, inclusivamente tecnologias digitais baseadas em IA e alimentadas por câmaras para monitorizar densidades de pessoas e reduzir o tempo gasto na fila.
Além disso, há locais onde robôs autónomos já está a ser implantados para manter os padrões de higiene e outros são equipados com sensores de temperatura corporal para ajudar a minimizar o risco de surtos de vírus.
3. Reimagine abordagens comerciais
Os perfis dos passageiros das companhias aéreas e dos hóspedes dos hotéis serão diferentes: mais hóspedes a lazer, janelas de reserva posteriores e maior procura por passagens flexíveis. As curvas de reserva históricas não são mais um bom indicador do comportamento atual. A agências e operadores de viagens precisa de usar todas as fontes de informação possíveis para antecipar a procura e otimizar os preços. Modelos de preços flexíveis também podem aliviar o desconforto do cliente com os níveis elevados de imprevisibilidade de hoje.
Os hotéis precisarão de encontrar novos propósitos para os espaços de reuniões e conferências, que recuperarão mais lentamente. As companhias aéreas precisam descobrir como preencher a classe executiva intercontinental, provavelmente com promoções de lazer premium. Para todas este universo das viagens, o boom pode ser maior no número de viajantes do que nos lucros, já que o negócio corporativo mais lucrativo está a demorar a retoma.
4. Aprenda com os momentos críticos
Além de otimizar processos e personalizar a experiência do cliente, o investimento em digital analytics pode permitir que as empresas identifiquem oportunidades de diferenciar os seus serviços. As empresas também seriam capazes de discernir as tendências emergentes e os contratempos antes que se transformassem em pesadelos. Os participantes da indústria, como os agentes de viagens online, também podem ser um tesouro de insights úteis relativos a como o ecossistema externo está evoluindo, enquanto as suas experiências podem ser benéficas para hotéis e companhias aéreas explorarem potenciais parcerias.
Certo é que as várias partes da indústria das viagens precisam trabalhar juntas como um todo para garantir um retorno seguro das viagens. Mesmo quando as empresas individuais melhoram suas operações internas, estas também devem ficar atentas aos desenvolvimentos em todo o setor, procurando oportunidades de colaboração. A indústria e os governos terão que chegar a um consenso sobre os padrões e requisitos de segurança e as aplicações móveis permitiria aos viajantes gerir certificados verificados para vacinas COVID-19 e resultados de testes, enquanto essas apps podem ser aceites e incorporadas no fluxo de trabalho de check-in nos voos.