Taleb Rifai: “A União Europeia será desafiada pelo BREXIT, mas não será o fim”
De visita a Portugal, o secretário-geral da Organização Mundial do Turismo, Taleb Rifai, analisou, em entrevista ao Publituris, o atual momento político nos EUA e na Europa e como isso poderá afetar o Turismo.
Publituris
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O secretário-geral da Organização Mundial do Turismo, Taleb Rifai, esteve em visita oficial a Portugal. Em entrevista, analisa o atual momento político nos EUA e na Europa e como isso poderá afetar o Turismo. Fala ainda da sua substituição, que acontecerá este ano.
Como define o momento atual do Turismo, considerando os últimos acontecimentos relacionados com o terrorismo, o BREXIT e a eleição de Trump?
Deixe-me primeiro responder definindo o momento histórico em que vivemos. Historicamente vivemos num período onde o Turismo e as viagens, sobretudo as viagens, tornaram-se uma das principais atividades humanas. Gosto de dizer sempre que vivemos na Época das Viagens. As pessoas nunca viajaram como viajam agora. Nenhum lugar na terra escapa à curiosidade das pessoas, seja a Amazónia, o Pólo Norte, o Pólo Sul, qualquer lugar. Mas, mais importante, é o número de pessoas que estão a viajar e o tipo de pessoas que viajam, que é tão diverso. Este é um facto.
O Turismo é um direito humano, porque as pessoas sentem que têm direito a explorar o mundo, a usufruir do mundo, assim como têm direito à Educação e à Saúde. Nada vai parar isso. Respondendo à questão de como isto se relaciona com o que está a acontecer hoje. Temos de distinguir duas forças: uma que está no lado certo desta história e as forças que estão no lado errado. Alguns acontecimentos estão no lado errado da história, e simplesmente não terão futuro, não são sustentáveis, mas podem infligir alguns danos. Uma ordem executiva de proibição de entrada num país imposta por 24h, 48h, uma semana, um mês, não será sustentável. A União Europeia (EU) será desafiada pelo BREXIT, mas não será o fim da EU de todo.
Quanto à segurança, o Terrorismo pode privar-nos de viajar num certo período, numa certa altura, mas rapidamente os destinos recuperam. Então, todas as estas forças, nós olhamos para elas como destrutivas, mas nada afetará o crescimento e a vontade de continuar a viajar. Estou atento ao que aconteceu, estou consciente e preocupado com estes acontecimentos, especialmente quando se relaciona o turismo com a segurança, isto é, quando alguns líderes políticos usam a segurança como desculpa para fechar as portas dos seus países. Isso é absolutamente desnecessário. A segurança pode ser conseguida através de melhores métodos, tecnologia, não através do isolamento.
Os países estão mais facilitadores do Turismo? Estou a falar de vistos por exemplo.
Sim, acredito que sim. Apesar de todas as notícias negativas que ouvimos todos os dias. O mundo está melhor para viver agora do que nunca. Não devemos distrairmo-nos pelas pressões do momento. Estamos mais conectados e tememos que o mundo esteja mais perigoso, mas na realidade não. O mesmo aplica-se ao Turismo. Não podemos ser distraídos por forças negativas, porque tal como disse, as pessoas vão contornar os obstáculos criados. Se um destino é afetado por determinados problemas de segurança, momentaneamente, as pessoas procuram outros destinos, até que esse destino se recupere.
O Turismo tem provado ser uma indústria, sensível à segurança claro, mas que recupera rapidamente e é muito resiliente. Se o destino tiver raízes e uma história e tradição no Turismo, o Turismo nunca vai acabar nesse destino. Olhando para o exemplo do Egipto. Nos últimos três anos, o país tem sofrido. Mas é um país com nove mil anos de história e que é visitado desde esse período e isso não será parado por nove dias, nove meses. Vai voltar porque tem tradição, tem raízes.
Qual é a sua definição de um país facilitador para o Turismo?
Existe uma descrição material e imaterial do que é um país facilitador para o turismo. A material tem a ver com a facilidade em chegar a esse país. É muito importante, saber se é necessário um procedimento complicado de obtenção do visto? Se é preciso apanhar muitos voos para chegar? Parte de ser um país facilitador para o Turismo é como se chega e entra no país. Depois disso, existe a atitude das pessoas e da sociedade do país. Alguns países olham para os turistas e reconhecem que estão ali para vivenciar a sua cultura e trazem benefícios à sua economia. Outros países têm uma atitude muito negativa e distante para os turistas. Isso é o que define um país mais facilitador do turismo de outro que é menos.
Mas o mundo tem ficado mais facilitador do Turismo, porque os países estão a ficar mais conscientes da importância e dos benefícios do Turismo e estão a abrir-se mais. Para dar um exemplo, no caso dos Vistos, desenvolvemos o Index of Openness, que mede o grau de abertura de cada país ou região. Isto é, qual a percentagem de pessoas que tiveram dificuldade em chegar a um sítio. Nos últimos sete anos, assistimos a uma descida de mais de 6 pontos percentuais no Openness Index. O Openness Index atualmente é de 63% e já foi de 71% há cinco anos. Está a ficar melhor, apesar das más notícias.
Qual deve ser o papel dos governos no desenvolvimento do Turismo nos seus países?
Os governos fornecem a liderança do sector, sem dúvida. A liderança e a estratégia só pode ser defina pelos governos. Mas o motor da implementação não está nas mãos do governo, mas do sector privado. Os governos criam as políticas, são motivadores, incentivam e lideram. Como qualquer líder no mundo, tem de motivar e mostrar o caminho, ter uma visão. Por outro lado, o sector privado é quem implementa esta visão no terreno, acelera e transforma em benefícios para as pessoas. O governo não pode fazer isso.
Gostava de falar um pouco dos mercados emergentes, como a China. Como é que vê estes mercados?
Há sete, oito anos, a Alemanha era o mercado outgoing número um. Desde então, a China tem-se rapidamente tornado o mercado número um, mas com grande avanço. No ano passado, houve perto de 150 milhões de chineses que viajaram para fora da China e gastaram 292 mil milhões de dólares. Este é apenas a ponta do iceberg. O mercado chinês deve ser visto como o mais promissor mercado no mundo. É também um mercado atrativo para receber turistas e visitantes. Os mercados emergentes representam hoje 50% do total de inbound. Há dez anos representavam 40%. Em 2030, vamos ter 60% em favor dos mercados em desenvolvimento e 40% dos mercados maduros. Se isto será verdade? Acredito que sim, porque fará o mundo e a distribuição mais equilibrada e justa. Os países em desenvolvimento necessitam mais que o mundo se torne mais justo e igual.
Portugal
Portugal é um país facilitador para o Turismo?
Sem dúvida, o grande ativo de Portugal são as pessoas. Podemos falar de cultura, de praias, paisagens, mas outros países do mundo podem dizer que têm as melhores praias, a cultura mais rica. São as pessoas que fazem a diferença e as pessoas em Portugal são muito especiais. Ontem enquanto me dirigia do meu hotel para aqui, pensava: os portugueses são práticos, modestos, afáveis e são eles próprios, não são pretensiosos. Sinto-me bem aqui, não sinto que tenha de ser aquilo que não sou. Posso ser aquilo que sou e as pessoas vão aceitar-me.
Este é um sentimento muito importante, porque quando viajamos para um sítio, viajamos para nos sentirmos relaxados, confortáveis, não viajamos para sentir tensões à nossa volta, ou para agradar este ou aquele. Aqui sentimos que as pessoas nos tentam agradar, não porque têm de fazê-lo, mas porque querem.
Durante algum tempo, em Portugal discutiu-se se os bons resultados do Turismo se devem aos problemas dos países da bacia do Mediterrâneo. Qual é a sua opinião? Estamos a crescer por causa dos outros países?
Não, isso é um mito e vou prová-lo com números. Portugal está crescer simplesmente porque é bom e está a fazer bem. Se somarmos todas as perdas do Egipto, da Tunísia e Turquia, os três países efetivamente importantes na bacia do Mediterrâneo, chegam a menos de quatro milhões. Estes são os nossos números. Se olharmos para Portugal e Espanha, que são semelhantes e recebem os mesmos turistas que estes países, ganharam num ano mais de 6 milhões de turistas. Espanha e Portugal, especialmente Portugal, está a sair-se bem, porque está a fazer bem, não porque outros não estão bem. É um mito, e julgo que devemos parar de pensar assim, isso não é justo para Portugal.
Como é que as cidades devem lidar com o crescimento do turismo. Não podemos simplesmente dizer: Vamos parar o Turismo.
Dizer: “Vamos parar o Turismo” é a saída mais fácil mas não resulta, porque as mesmas pessoas que dizem para pararmos o Turismo, são as primeiras depois a perguntarem onde estão os turistas quando deixarem de vir. Lisboa não é como as cidades de Barcelona e Veneza. Lisboa é mais larga, consegue acomodar melhor os turistas no seu centro e tem mais diversidade. O problema nunca serão os números, o crescimento e os números não são o inimigo.
O turismo não é o inimigo. O desafio é como gerimos o turismo, as multidões, os números. Porque se caímos no erro de dizer vamos parar o Turismo, o crescimento é a história da humanidade, é o nosso futuro. O crescimento é essencial para a continuação da vida. Não devemos ter medo do crescimento em qualquer área ou sector, mas devemos ser cada vez mais cautelosos e com mais capacidade para gerir estas multidões. É esse o desafio. As pessoas que dizem que devemos parar o Turismo não estão a fazer o seu trabalho, estão só a esconder o problema e a usá-lo como desculpa. Há bons exemplos de como lidar com o crescimento.
Temos de retirar a atenção dos locais mais procurados, criar atrações fora dessas áreas para distribuir melhor as pessoas. Devemos usar a energia e o poder que os números e o crescimento trazem para beneficiar outras áreas da cidade. Em algumas cidades, já se visita outros locais além dos centros.
Voltando ao terrorismo e aos países que sofreram ataques. Reagiram todos da mesma maneira?
Definitivamente não. Os países reagem de formas diferentes a estes acontecimentos e essa é uma questão importante. Porque a prevenção destes ataques, a forma como se lida com eles durante e depois de acontecerem são três fases muito importantes.
Vou dar o exemplo da Turquia. Quando o aeroporto da Turquia foi atacado, passado oito horas apenas, o aeroporto já estava aberto. O que é que isso significa? Foi uma mensagem para o Terrorismo: queriam parar-nos, não foram bem-sucedidos. Ao mesmo tempo, é um reflexo que estavam bem preparados. Infelizmente, hoje em dia, ainda estamos a habituarmo-nos ao facto que um plano de reação ao terrorismo deve fazer parte da estratégia nacional. Muitos governos e autoridades estão bem protegidos contra o terrorismo, mas não as infraestruturas para o turismo. Muitos países no mundo não estão preparados, sempre que acontece um ataque num local turístico ou numa infraestrutura turística ficamos surpreendidos e perguntamos como foi possível. Temos de estar preparados, porque o mundo mudou e temos de estar preparados para isso.
Eleições OMT
A eleição do novo secretário-geral acontece este ano. Quais são as suas expectativas para este processo?
Estou a terminar o meu segundo mandato. Estou na Organização Mundial do Turismo desde 2010. Substituí um secretário-geral que era completamente diferente de mim, mas fez um trabalho tremendo. Ele estabeleceu os princípios e construiu a OMT desde dentro. Quando cheguei, tinha uma personalidade diferente, e levei a organização para um caminho diferente. Assim sendo, sei que a organização vai escolher a melhor pessoa. Tenho confiança nisso. Mas assumir que a pessoa que me vai substituir será exatamente igual a mim, ou meu antecessor, não é justo.
O próximo líder, homem ou mulher, irá liderar da sua forma e levará a OMT para um nível superior e diferente. Estou muito otimista sobre este processo e o grande número de candidatos é um sinal positivo e saudável que as pessoas estão interessadas e que a organização se tornou importante e visível. Existem agora seis candidatos conhecidos, mas o deadline é 11 de Março para a apresentação de candidaturas, provavelmente serão mais dois ou três. Mas é já um número elevado, porque geralmente a eleição é feita entre dois candidatos.
Apoia algum candidato em particular?
Apoio todos os candidatos, são todos diferentes, à sua maneira.
A OMT está mais forte do que nunca?
Penso que a OMT está mais visível e relevante do que antes não por aquilo que fizemos, o que fizemos contribui em parte para isso, mas por aquilo em o Turismo se tornou. Quando o sector se torna mais importante, a instituição torna-se mais importante.
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Perfil
Taleb Rifai nasceu na Jordânia, em 1949. Formado em Arquitetura, pela Universidade do Cairo, é ainda doutorado em Urbanismo pela Universidade da Pensilvânia, em Filadélfia (1983). Entre 1999 e 2003, assumiu várias pastas no governo da Jordânia, primeiro como Ministro para o Planeamento e Cooperação Internacional, depois como Ministro da Informação e, em 2001, como Ministro do Turismo. Nessa qualidade, criou o primeiro Parque Arqueológico da Jordânia, na antiga cidade de Petra, e promoveu outros projetos em cidades como Gérasa e Wadi Rum. Em 2010, tornou-se Secretário-geral da Organização Mundial de Turismo (OMT), baseado em Madrid, sucedendo no cargo ao francês Francesco Frangialli.