“O sector bancário é de longe o maior hoteleiro do País”
Stefano Saviotti dispensa apresentações. É o fundador de um dos grupos pioneiros na hotelaria portuguesa, o Dom Pedro Hotels. Falou com o Publituris na semana em que o seu hotel Dom Pedro Laguna, no Brasil, foi considerado o melhor resort da América do Sul. Como é que foram estes anos para o Grupo Dom Pedro… Continue reading “O sector bancário é de longe o maior hoteleiro do País”
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Como é que foram estes anos para o Grupo Dom Pedro (desde 2008 até 2014)?
Em 2008 começou a grande crise financeira e afectou muito a hotelaria, porque havia menos dinheiro e menos Turismo. O grupo Dom Pedro sempre teve o cuidado de ter uma solidez financeira muito forte. A crise passou para nós sem problemas. Não tivemos problemas financeiros, mas tivemos uma perda de clientes e, fundamentalmente, uma redução do preço médio. A redução do preço para manter o mínimo de fluxo turístico foi um problema mundial.
Quando é que se começou a notar a recuperação? Pode-se dizer que a crise já foi ultrapassada?
Acho que estamos a recuperar de um modo geral no nível de clientes e de entradas em Portugal, mas também temos que pensar que a oferta aumentou muito rapidamente e fortemente. A nível de preço médio ainda não houve recuperação. Os preços médios da hotelaria ainda estão inferiores a 2008.
Mesmo em 2015?
Sim, mesmo em 2015 a média é inferior a 2008.
Mas isso agora já tem mais a ver com o aumento da oferta do que o número de turistas que estamos a receber?
Claro que no momento em que há mais procura, os preços começam a subir, mas não sobem no próprio dia, porque os contratos com os operadores são feitos com muita antecedência, estou a falar de congressos, grupos. Portanto, um congresso realizado em 2015 foi contratado em 2013. Penso que só a partir de 2016 é que vamos recuperar definitivamente aquele ‘gap’ de preços que se sentiu a partir de 2008.
Durante estes últimos anos assistimos à insolvência de alguns projectos hoteleiros. Problemas de liquidez, muitos com uma grande dívida à banca. No caso do Grupo Dom Pedro, como é que se acautelaram da crise? Preferiram avançar com grandes investimentos?
A decisão foi muito simples. Em 2005 e 2006 já havia alguns sintomas de que poderia haver uma crise. Para mim existem dois sintomas que são muito significativos: o aumento do petróleo, – em 2006 o preço do barril chegou aos 150 dólares; e os juros também subiram 6/7%. O que é que decidimos? Não avançar com novos investimentos, consolidar os investimentos feitos e ter uma situação financeira desafogada.
O Grupo Dom Pedro foi um dos pioneiros do Turismo em Portugal. Foram pioneiros e inovadores: foram dos primeiros a ter pacotes de golfe no Algarve, all inclusive na Madeira, introduzir os buffets. Qual julga ser o posicionamento alcançado pelo grupo? E qual é o posicionamento actual?
O Grupo Dom Pedro tem sido sempre inovador, acabou de referir algumas inovações. Sempre procurámos oferecer algo diferente dos outros. Portanto, o objectivo do grupo é a diferenciação. Neste momento, estamos a fazer um conjunto de investimentos nas unidades que temos, sobretudo na ilha da Madeira, onde havia mais necessidade de fazermos investimentos em renovações. Por outro lado, estamos também a apostar na tecnologia, com um sistema novo de Internet wireless de alta velocidade para o cliente e interacção com a TV no quarto. Este é um tipo de inovação que estamos a fazer para o cliente que hoje procura muito a tecnologia. Dentro das nossas estruturas, procuramos ter cada vez mais informatização e automatização dos sistemas de administração, contabilidade e reservas.
A questão é que nós precisamos de um centro de congressos para mais de 15 mil pessoas. Nenhum hotel tem essa capacidade ou algo que pareça.”
A Madeira tem duas questões: a dificuldade do transporte aéreo e o reforço da capacidade promocional da Madeira. Sei que o Governo Regional tem feito um esforço na estratégia promocional. Agora estamos à espera dos frutos desta estratégia, para dar uma imagem mais moderna da Madeira. Vale a pena conservar as tradições e a cultura madeirense, mas a Madeira tem que ser mais do que isso, tem que ser também atractiva para gente mais nova. A Madeira era muito procurada no Inverno e o Verão era a época baixa. Isso inverteu-se e o Verão é a época alta e o Inverno perdeu clientes. Penso que a razão fundamental para isso ter acontecido é por terem surgido destinos concorrentes com um clima ainda melhor, nomeadamente no Norte de África. Só que hoje estes países vivem num clima social e de insegurança muito negativo. Por isso, penso que pode voltar a aparecer uma procura para destinos como a Madeira, que não têm as mesmas condições que os destinos do Mar Vermelho, mas que têm uma segurança e uma tranquilidade que esses destinos já não oferecem.
Tivemos uma recuperação muito forte do Algarve. No caso de Vilamoura, temos uma situação muito positiva, por causa da compra de Vilamoura pelo grupo Lone Star, que comprometeu-se a fazer grandes investimentos, não só a nível de infra-estruturas, como a nível promocional, ou seja, voltar a pôr Vilamoura como um destino top mundial. Isto para nós é muito positivo. Vai beneficiar hotéis, restaurantes, comércio, a marina. Tudo isto vai animar se tivermos um nível de Turismo com mais qualidade e capacidade de compra. Um dos problemas do Algarve é que não conseguimos ter, mais uma vez, o nível económico de turistas de outros destinos turísticos.
Não será por falta de qualidade do Algarve. É por falta de posicionamento?
É a imagem. Uma pessoa tem uma imagem de Ibiza, Saint Tropez e Cannes fantásticas do ponto de vista económico e tem uma imagem menos ‘fashionable’ do Algarve. Devo dizer que eu conheço muito bem todos estes destinos e se comparar a qualidade do Algarve em relação a Ibiza, é uma coisa impressionante: a capacidade de saneamento básico não é suficiente, tem falta de infra-estruturas, engarrafamentos brutais, a Internet não funciona porque não está preparada para aquele fluxo de Turismo. Apesar disso, os preços da restauração e da hotelaria são o dobro dos preços praticados no Algarve. Temos que posicionar o nosso produto para aquilo que ele realmente vale.
Como é que se faz isso?
Temos que inovar e inventar como outros países o fizeram. Claro que o festival de cinema de Cannes é um momento cool, onde aparecem actores, actrizes, realizadores e, portanto, a imprensa mundial está lá reunida e transforma aquele evento num fenómeno mundial. Nós não temos nenhum evento que seja minimamente comparável com isto. Precisamos de criar alguns eventos, que tenham prestígio internacional. Em Portugal tivemos um evento que tinha prestígio internacional, que era a Fórmula 1, que criou uma imagem do Estoril muito importante naquele período. Perdemos a Fórmula 1 e sentiu-se efectivamente este esquecimento. Se não se fala de um destino, ele desaparece. Ibiza vive dos grandes nomes da música que actuam nas discotecas, os Dj’s, a Paris Hilton, etc. Penso que, fundamentalmente, Portugal precisa de criar eventos de grande prestígio. Tivemos um evento que pôs Lisboa no mapa, que foi a Expo 98. A Expo teve um significado muito importante para Lisboa e que durou vários anos. Depois este fenómeno esmorece, não dura para sempre.
Falta falar de Lisboa. Recebemos alguns eventos que também atraíram muitos turistas, como a final da Liga dos Campeões, o Congresso dos Rotários?
Atraem, mas não são muito mediáticos, porque não têm nomes sonantes que criam aquele mediatismo que precisamos. Mas evidentemente que cada um destes eventos é importante. Precisamos de eventos para chamar a atenção. Lisboa, neste momento, tem uma imagem muito boa. Como sabe, vivo muito mais no estrangeiro do que em Portugal e, portanto, sei o que se passa fora e o que se fala de Portugal. Acho que, honestamente, Portugal é considerado, nomeadamente Lisboa, como um destino seguro, com bom clima, boa gastronomia e as pessoas são simpáticas. Mas continua a ser muito desconhecido. Não está ao nível de outras capitais. Um outro ponto que considero que faz falta a Lisboa é um centro de congressos. É um daqueles casos que espero que se possa voltar atrás sobre uma decisão tomada.
Na altura, as opiniões sobre a necessidade de um Centro de Congressos em Lisboa não foram consensuais, mesmo entre os hoteleiros.
Também tenho infra-estruturas para meetings. A questão é que nós precisamos de um centro de congressos para mais de 15 mil pessoas. Nenhum hotel tem essa capacidade ou algo que pareça. Como sabe, o nosso resort no Brasil está perto da cidade de Fortaleza, o centro de congressos da cidade tem 74 mil metros quadrados de área de construção, ou seja, é muito maior que toda a FIL, e tem duas salas de 16 mil metros quadrados. Ou seja, dá para 20 mil pessoas e a cidade é Fortaleza, não é uma capital.
Na altura, estive numa reunião da Confederação do Turismo Português e concluímos que um aumento do nível de impostos e taxas para o Turismo não era positivo. Basta olharmos para número de unidades que já entraram em ‘default’. Acho que, aliás, o sector bancário é de longe o maior hoteleiro do País, o que significa que não há ainda o equilíbrio económico do sector turístico hoteleiro. Portanto, o aumento da carga fiscal de uma maneira ou de outra não é positivo. Mas havia questões que podiam ser conversadas e negociadas tendo a noção clara de como estas verbas iriam ser aplicadas. Isto foi o que saiu da reunião da CTP e que foi transmitida por carta à Câmara de Municipal.
É claro que quando se diz qua a taxa é paga pelo turista, tudo é pago pelo turista. O que acontece é que o turista depois faz contas daquilo que paga. Quanto maior for o custo total, menos competitivo é o destino. Duas pessoas num quarto são logo dois euros, se a receita média da hotelaria em Lisboa é de 80 euros, dois euros significam 3% dessa receita. Portanto, não é tão displicente como isso e, às vezes, é o início de uma taxa que facilmente pode ser aumentada, conforme as necessidades. Tenho algum receio quando se cria um novo imposto. Mas se esta taxa servisse para algo que tem interesse para o Turismo, que possa trazer um turista com mais capacidade de compra, este é um aspecto que vale a pena analisar e desenvolver.
E quanto ao IVA da Alimentação e das Bebidas, considera que deveria baixar?
A taxa média de IVA na restauração na Europa é 10 ou abaixo de 10%. Em Itália é de 10%, em Espanha é 10% e em Portugal é 23%. Temos uma diferença substancial. Claro que isto para nós é um peso superior, isto sai da receita líquida do hotel ou do restaurante e piora os resultados económicos. Li um artigo há seis meses no qual a Comissão Europeia dizia que cerca de 60% das actividades turísticas portuguesas estavam em perigo de insolvência. Quando verificamos este tipo de informações que é dada por uma entidade totalmente independente, temos de nos preocupar com a situação real, e não teórica, do sector. O sector tem fragilidades muito grandes. Foi muito financiado, os juros tornaram-se muito pesados, passou um período de cinco, seis anos no qual tiveram prejuízos de exploração, antes mesmo da função financeira e, portanto, encontram-se muitas unidades em situação de insolvência. Muitas já foram entregues ao sistema bancário, que também não as quer, porque não é função da banca gerir hotéis. Portanto, temos que ver a situação real e tentar corrigi-la. Não pode estar tudo bem, porque atravessámos uma crise nestes anos, como eu nunca tinha conhecido. Afectou diferentes sectores, assistimos a falências de empresas e de bancos que teria sido impensável que pudesse acontecer. Toda a economia mundial ainda não saiu desta recessão, está no bom caminho e esperamos que mantenha este bom caminho.
Brasil
Apesar da crise em Portugal, continuaram a desenvolver o resort no Ceará, Brasil, o Aquiraz Riviera, e abriram em 2011 o hotel Dom Pedro Laguna. Em que fase está o resort?
O resort está numa fase concluída do ponto de vista das infra-estruturas. Está construído o Hotel Dom Pedro Laguna, estão abertos mais dois apart-hotéis, com um total de 450 apartamentos, que já entraram em funcionamento este ano. Estamos a contruir um conjunto de casas de alto nível que também estão vendidas e construídas em conjunto com parceiros locais, e temos muito mais para desenvolver, porque o projecto é do tamanho de uma Quinta do Lago. Para que todas as construções estejam concluídas ainda vai levar vários anos.
Como é que está o mercado brasileiro?
Nos últimos meses, o Brasil parou à espera de uma definição política. Acho que o problema do Brasil é mais um problema político do que económico. Até haver uma definição política, dificilmente vamos melhorar o problema económico. É um país muito grande, a sua dimensão permite uma resiliência que um país pequeno podia não ter, tem recursos naturais fantásticos e, portanto, acredito, que o Brasil vai sair muito bem desta crise.
Em relação ao Turismo, haverá uma tendência para o aumento do Turismo Interno e, portanto, estamos a sentir os benefícios desta situação. A saída para o estrangeiro está mais limitada. Por outro lado, no que diz respeito ao imobiliário turístico, também há muito pouca oferta, porque existem poucos resorts do género do nosso e isso permite-nos encarar com tranquilidade a situação. Por último, o que fizemos foi novamente ter uma situação financeira extremamente sólida.
Sim, temos o nosso sócio brasileiro, o grupo M. Dias Branco, que é um dos maiores grupos do Brasil, o Grupo Violas, Dom Pedro, e um Fundo de Investimento, onde participam vários investidores. O projecto é completamente auto-financiado.
Tencionam investir mais no Brasil?
Temos mais projectos no Ceará: um projecto perto do Aquiraz, que entrou em licenciamento. Trata-se de um loteamento junto à praia e estamos à espera da licença para avançar. Mas sempre em parceria com os nossos parceiros no Brasil. No Brasil não convém trabalhar sem um sócio local.
Associativismo
Foi fundador da Associação da Hotelaria de Portugal (AHP) e da Confederação do Turismo Português (CTP). Como é que olha hoje para o associativismo?
Afastei-me um pouco, porque como passo pouco tempo em Portugal, não tenho tempo para acompanhar o associativismo. É uma responsabilidade minha. Aliás, dos hoteleiros em geral. A hotelaria não tem tido um grande espírito associativo. Alguns com o seu esforço pessoal tentam desenvolver a actividade, mas não há uma união de esforços. Há muitas associações, e isso enfraquece ainda mais. Por isso, na altura, quis, juntamente com outros, criar a CTP, que começou como o Conselho Nacional das Empresas de Turismo e era uma delegação da Confederação da Indústria Portuguesa (CIP). Depois, quando cresceu o suficiente, tornou-se na CTP. O objectivo era juntar todas as várias associações do sector debaixo do mesmo chapéu. Nós optámos por ficar na CTP que representa do conjunto total das regiões e dos sectores.
Como é que vê a situação da TAP?
Por enquanto não temos a noção de como vai funcionar esta privatização, mas temos a esperança que tenha uma dinâmica muito positiva e que aumente o número de aviões, ligações, destinos, etc.
Por exemplo, verificámos um dinamismo positivo na privatização da ANA. Sentimos o aeroporto, nomeadamente, o Aeroporto de Lisboa com uma dinâmica diferente. Já acontecia com a ANA pública, mas hoje essa dinâmica acelerou.
A privatização da TAP não tinha alternativa. Portanto, é importante que agora tenham capacidade de injectar dinheiro e façam todos os investimentos que a TAP necessita.
Futuro
Em 2012, disse numa entrevista que o seu objectivo era abrir mais hotéis em cidades. Mantém essa intenção?
Passados três anos ainda não fizemos nada. Primeiro, porque estes últimos anos foram anos difíceis para o Turismo. Neste momento, a cidade onde queremos abrir um hotel é no Porto. Estamos à procura de uma localização para poder abrir um hotel na cidade. Até 2016, gostaríamos de concretizar a compra de uma unidade ou de um terreno. Pode ser uma unidade já existente, o que se torna uma solução mais rápida, ou então um terreno apto para a construção de raiz. Seria uma unidade no centro da cidade, mais para lazer, mas claro que depois terá sempre uma componente de negócios. Não estamos a pensar em unidades fora do centro da cidade.
Por onde passa o futuro do Grupo Dom Pedro?
Temos esta responsabilidade muito grande no Brasil, porque estamos a desenvolver um projecto gigantesco, que absorve grande parte do nosso tempo. Em Portugal, estamos sempre com atenção ao que pode aparecer. Temos tido várias conversas. Estamos abertos a oportunidades que possam aparecer, até em Lisboa.
Com o know-how que o grupo detém, a gestão de activos poderia ser uma opção de negócio?
Fiz isso no passado, entre o final dos anos 70 até quase 2000. Deixámos este modelo, porque o tamanho médio das unidades em Portugal obriga a um esforço de gestão cuja remuneração não é interessante. E, portanto, acabámos por perder a concentração nas nossas unidades, para acompanhar unidades que muito pouco contribuíam para o resultado do grupo.
Alguma vez recebeu uma proposta para vender o Grupo Dom Pedro?
Recebo quase todos os dias. Há muita procura para Portugal nestes últimos anos. Há muitos contactos, mas penso que muitos destes são na tentativa de encontrar um “negócio sob stress”, o que não é o nosso caso. ¶