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Opinião

Morte de copiloto não desobriga a companhia aérea de indemnizar os passageiros pelo voo cancelado

O tribunal europeu entende que não constitui uma circunstância extraordinária – que excluiria a indemnização – porquanto, como qualquer doença inesperada de um tripulante indispensável, faz parte do exercício normal da atividade da companhia aérea.

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Morte de copiloto não desobriga a companhia aérea de indemnizar os passageiros pelo voo cancelado

O tribunal europeu entende que não constitui uma circunstância extraordinária – que excluiria a indemnização – porquanto, como qualquer doença inesperada de um tripulante indispensável, faz parte do exercício normal da atividade da companhia aérea.

Carlos Torres
Sobre o autor
Carlos Torres

O caso respeita a um voo regular da TAP, em 17 de julho de 2019, de Estugarda para Lisboa, com partida às 06h05, o qual foi cancelado porque o copiloto foi encontrado morto, na cama do hotel, duas horas antes da partida. A tripulação informou que não estava apta para voar devido ao choque sofrido – de qualquer modo, o voo carecia imperativamente de dois pilotos – tendo os passageiros sido transportados num voo de substituição, que partiu no mesmo dia às 16h40.

A companhia aérea recusou-se a pagar indemnizações por entender que o infeliz acontecimento se enquadra no conceito de circunstâncias extraordinárias, ou seja, a morte súbita do copiloto, um pai de família de meia-idade que tinha passado sem dificuldade os exames médicos periódicos obrigatórios, era completamente imprevisível e surpreendente para todos. No entanto, foram intentadas ações judiciais por prestadores de serviços jurídicos a passageiros aéreos (flightright e Myflyright) peticionando as respetivas indemnizações.

A matéria foi submetida ao Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) pelo Tribunal Regional de Estugarda, respeitando à interpretação do n.° 3 do art.º 5º do Regulamento nº 261/2004 de 11 de fevereiro de 2004, que estabelece regras comuns para a indemnização e a assistência aos passageiros dos transportes aéreos em caso de recusa de embarque e de cancelamento ou atraso considerável dos voos, que dispõe o seguinte: “A transportadora aérea operadora não é obrigada a pagar uma indemnização nos termos do artigo 7º, se puder provar que o cancelamento se ficou a dever a circunstâncias extraordinárias que não poderiam ter sido evitadas mesmo que tivessem sido tomadas todas as medidas razoáveis.”

A interrogação colada pelo tribunal alemão de recurso onde corre o processo ao TJUE, foi no sentido de apurar se um voo com partida de um aeroporto situado fora da base da transportadora aérea operadora é cancelado devido ao facto de, pouco antes do seu início, o copiloto, que passou sem restrições os exames médicos periódicos prescritos, ter morrido de forma súbita e imprevisível para a transportadora aérea, que era incapaz de realizar o voo, constitui uma circunstância extraordinária.

O TJUE decidiu que a transportadora não estava isenta de sua obrigação de indemnizar os passageiros de harmonia com o art.º 7º (em geral, 250€, 400€ ou 600€ consoante as distância do voo) porque o cancelamento do voo não foi devido a circunstâncias extraordinárias. Para os juízes europeus a ausência de um ou mais trabalhadores essenciais à execução de um voo faz parte do normal desempenho da atividade da transportadora aérea operadora e, por conseguinte, não se enquadra no referido conceito de circunstâncias extraordinárias.

Em caso de ausência, não pode, pois, ser feita qualquer distinção em função da respetiva causa, pelo que é irrelevante se um voo não se realiza porque um tripulante adoeceu inesperadamente ou morreu pouco antes da partida.

Uma interpretação algo surpreendente do TJUE que, no entanto, é vinculativa para os tribunais dos Estados-Membros.

Sobre o autorCarlos Torres

Carlos Torres

Jurista e professor na ESHTE
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