Turismo rural: segmento em mudança
Com o crescimento do turismo no país, também a procura pelo turismo rural está a aumentar e a mudar, muito por culpa dos novos hábitos de consumo e das preocupações ambientais. Mas há coisas que não mudam, como os desafios que este segmento continua a enfrentar.

Inês de Matos
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Em 2017, a oferta de turismo rural no país cresceu 10%, para 1419 unidades, e a procura terá crescido ainda mais, apesar de ser difícil ter dados concretos sobre este segmento, já que o TER está integrado no Alojamento Local, a área que apresentou maior crescimento em 2017, com um aumento de 28,8% no número de hóspedes e de 26,7% no total de dormidas. E, no futuro, a tendência deverá manter-se, até porque, como diz ao Publituris a professora Antónia Correia, diretora da Faculdade de Turismo e Hospitalidade da Universidade Europeia, que em 2016 elaborou um estudo sobre o tema, “devido ao grande crescimento populacional e à concentração em centros urbanos, a tendência é a afirmação do turismo rural e de natureza ao nível mundial”, refere a responsável, explicando que também o envelhecimento da população e o aumento da esperança de vida contribuem para o aumento da procura por este tipo de turismo. “Este prolongamento da vida ativa reflete-se também em hábitos de vida mais saudáveis, sendo que a idade biológica deixa de corresponder à idade psicológica. Este desfasamento etário traduz-se num código de comportamentos e interesses mais jovens, hábitos alimentares mais saudáveis e formas de lazer mais descontraídas, atributos que só o turismo de natureza e/ou rural podem oferecer”, explica Antónia Correia.
Atualmente, o turismo rural representa 58% do fluxo total de turistas a nível internacional, peso que baixa para os 27% em Espanha e que é ainda “muito reduzido” em Portugal, acrescenta a professora da Universidade Europeia, considerando, no entanto, que “estas formas de turismo se complementadas com o turismo de saúde constituirão umas das formas mais procuradas do século XXI”, defendendo que o crescimento registado em Portugal vai levar a “um reposicionamento a muito curto prazo”.
Por enquanto, as unidades portuguesas são “por inerência de muito pequena dimensão” e a oferta continua a estar concentrada nas “atividades agrícolas ou de enologia”, pelo que, defende a professora Antónia Correia, na base da sua diferenciação está a “hospitalidade dos que recebem os turistas” e a própria dimensão dos empreendimentos, “que de tão pequenos oferecem um tratamento extremamente personalizado ao seu hóspede fazendo-o sentir-se em casa fora de casa”, afirma.
Qualidade
Conscientes desta realidade, as unidades de turismo rural em Portugal têm vindo a fazer um esforço para mudar e, hoje, a imagem que temos das antigas unidades de turismo rural – onde se dava de comer aos animais e se dormia em quartos decorados com crucifixos nas paredes – já não corresponde, de todo, à realidade. “As maiores diferenças prendem-se com a maior qualidade dos turismos rurais”, confirmam Filipa e Jorge Castelão, fundadores da Colina dos Piscos, unidade de turismo rural localizada em Casais da Abadia, Ourém, na região Centro do país, aberta desde 2017. De acordo com os responsáveis pela Colina dos Piscos, “os consumidores estão a valorizar as soluções de maior proximidade e menor dimensão, associadas à natureza e de âmbito rural”.
Realidade idêntica relata a Herdade da Barrosinha, em Alcácer do Sal, que sublinha que, atualmente, “há uma clara aposta na qualidade”. “As unidades de alojamento estão cada vez mais adequadas e oferecem um vasto leque de serviços. Os produtos regionais têm muita qualidade e o cuidado de fazer as coisas simples bem, valoriza o nosso serviço”, refere a Herdade da Barrosinha ao Publituris, explicando que, “os clientes apreciam a Herdade pelo seu sossego e possibilidade de descansar”.
Já Eglantina Monteiro, diretora da Companhia das Culturas, unidade de turismo rural em Castro Marim, no Algarve, que abriu em 2009, diz que os turismos rurais em Portugal “genericamente são bons, muito bons e há uns excecionais, surpreendentes, fascinantes”, defendendo que “o que distingue as unidades hoteleiras de turismo rural das demais é o facto da quase totalidade dos turismos rurais serem projetos individualizados”. “São poucas as unidades nesta categoria que pertencem a grupos hoteleiros”, refere, sublinhando que quase todos “são projetos de pessoas para pessoas”. “O turismo rural é muito marcado pela personalidade dos proprietários, pelo modo como estes entendem o lugar”, o que faz com que “cada unidade seja um lugar único, irrepetível”.
Procura
Como refere Antónia Correia, o público que procura turismo local prefere “alojamentos que sejam acolhedores e modernos, com ambiente calmo e relaxante e com instalações privadas. Ao nível do espaço, o alojamento deve apresentar condições de higiene e segurança, integrados na paisagem natural, potenciando a sua apreciação, um ambiente calmo e tranquilo, assim como quartos personalizados e confortáveis, além de atividades culturais locais, excursões e atividades sociais e ambientais sustentáveis”.
Assim, além do contacto com a natureza e atividades rurais, a grande maioria destas unidades tem vindo a adaptar a oferta à novas exigências dos consumidores, como referem Filipa e Jorge Castelão, que explicam que os clientes da Colina dos Piscos são, na maioria, portugueses das grandes zonas metropolitanas, mas também europeus e americanos, que “procuram um refúgio não massificado na natureza, a atenção pessoal e no detalhe”. “O feedback recebido pelos nossos hóspedes é no global muito positivo. O contato com a natureza e especialmente com o nosso lago, é muito apreciado”, referem os responsáveis, destacando o lago da propriedade, onde os clientes podem mergulhar e realizar outras atividades físicas.
Na Herdade da Barrosinha grande parte dos clientes são oriundos do mercado nacional, ainda que na época alta a unidade também receba muitos clientes espanhóis, italianos, britânicos e alemães, notando-se também “um crescimento na procura por parte do mercado francês”. A maioria, refere a unidade, são famílias com filhos, casais em fim de semana e clientes em trabalho, que procuram a unidade pelo sossego, mas que também apreciam os vinhos e a gastronomia. “As provas de vinhos são muito valorizadas e a gastronomia baseada nos produtos da região é destacada pelos hóspedes”, refere a Herdade da Barrosinha, que realiza as provas de vinhos na Taberna da propriedade.
Já na Companhia das Culturas, que se afirma como um ecoturismo, os clientes são na “maioria estrangeiros (alemães, ingleses, franceses e espanhóis), contudo, a nacionalidade maioritária é a portuguesa”, têm entre 27 e 45 anos de idade e são, por norma, pessoas das áreas da arquitetura, design, artistas visuais e técnicos superiores, que têm essencialmente “preocupações ecológicas” e cuidado com a alimentação, daí que as refeições na unidade sejam confecionadas com produtos locais.
De acordo com a responsável, os clientes também apreciam o facto da Companhia das Culturas ser uma “unidade rural em regime policultura” e de contar com uma arquitetura inteligente. “O feedback tem a ver com o que singulariza um lugar. No nosso caso, é o facto de sermos uma unidade de agricultura tradicional e do edificado ser uma reconstrução da antiga casa agrícola pela mão de um arquiteto, Pedro Ressano Garcia, que estabelece um diálogo com as pré-existências”, refere Eglantina Monteiro, destacando a Cork Box, uma antiga garagem debulhadora que foi totalmente forrada a cortiça aquando da reabilitação e que, hoje, é usada para a prática do Yoga, todas as terças-feiras e sábados.
A Companhia das Culturas destaca-se também por oferecer uma “alimentação exclusivamente do lugar e da época”, bem como por não dispor de “televisão ou música ambiente”, o que revela uma “forma de estar mais reservada, mais atenta”, considera a diretora, que assinala ainda o Hamam, “o primeiro feito de raiz no Portugal contemporâneo” e que “é também uma ancoragem no lugar”, já que reporta “à tradição dos banhos públicos e salutares do mediterrâneo desde a época romana e árabe cuja marca é bem patente na nossa cultura”.
Desafios
Apesar do período dourado que o turismo rural parece viver, existem ainda desafios que se atravessam no caminho deste segmento turístico, com Antónia Correia a sublinhar que “é preciso reforçar a comunicação, facilitar mais informação sobre a oferta disponível e diferenciar a oferta, tanto em termos de serviços como de entretenimento”. O reforço da oferta vai permitir, defende a responsável, “melhorar a sua quota de mercado, fundamentalmente no mercado alemão que é, por inerência, o mercado com maior propensão para o turismo rural”, considera Antónia Correia, referindo que para potenciar este segmento é necessário que exista “complementaridade entre atividades de natureza, saúde, bem-estar e desporto porque cada vez mais o turismo é uma experiência social, pessoal e espiritual”.
Já Eglantina Monteiro destaca a sustentabilidade da atividade, uma vez que, defende, “o forte crescimento da hotelaria e do turismo em geral é preocupante”. “O grande desafio é, também aqui, o da sustentabilidade, perdurarmos no tempo, mantermo-nos quando esta vaga passar”, considera, recordando que “as árvores não crescem até ao céu”.
Mas há desafios mais concretos e até urgentes no atual panorama, a exemplo dos recursos humanos qualificados, como aponta a Herdade da Barrosinha, que considera que “a falta de mão de obra qualificada continua a ser um desafio. O turismo é um setor que exige muito tato e há um esforço por parte das escolas profissionais em formar cada vez mais pessoas nesta área. Os colaboradores devem possuir várias valências e o aumento da procura por parte do mercado internacional exige contratar mais pessoas para o setor”, defende a unidade.
Já a inovação e a necessidade de criar uma maior proximidade ao cliente são os desafios identificados por Filipa e Jorge Castelão, que sublinham ainda que, no caso da Colina dos Piscos, “as dificuldades prendem-se com a construção de um novo destino”, uma vez que, ainda que a unidade esteja localizada a apenas 13 quilómetros de Fátima, a zona onde a unidade se insere “não tem tradição turística”.
Herdade da Barrosinha amplia alojamento
Na Herdade da Barrosinha, em Alcácer do Sal, Alentejo, este verão vai ser agitado, já que está prevista a reabertura do Hotel Rural da Barrosinha, que foi ampliado para 37 quartos e que esteve encerrado ao longo dos primeiros meses do ano.
Mas, além da ampliação do hotel, a Herdade da Barrosinha inaugurou, em outubro do ano passado, as Casas da Barrosinha, seis unidades com um ou dois quartos, sala de estar, terraço e kitchenette, que resultaram da recuperação das antigas casas dos trabalhadores da herdade e que motivaram um investimento de 400 mil euros, que envolveu também a renovação da Taberna da propriedade, que manteve um estilo rústico. Neste espaço, com 100 lugares sentados e que abre diariamente, é possível degustar alguns dos produtos locais e os melhores vinhos da herdade.
Companhia das culturas, o melhor de dois mundos
O Algarve não é, à partida, um destino que associamos ao turismo rural, já que a região é sinónimo de praia para a esmagadora maioria dos portugueses e também estrangeiros. Mas é lá que se localiza a Companhia das Culturas, situada em Castro Marim, o que nos levou a perguntar a Eglantina Monteiro o porquê de abrir um hotel rural num destino que está associado à praia. “Estamos a 1,5km da Praia Verde, e isso é, digamos, ter o melhor dos dois mundos”, considera a responsável, explicando que a decisão de abrir o hotel rural se deveu ao facto da propriedade onde se localiza a Companhia das Culturas pertencer “à mesma família há sete gerações”, além de ter sido “sempre uma importante casa agrícola pela capacidade de dinamizar social e economicamente esta área do sotavento algarvio”. “A desativação de uma série de edificados outrora associados à agricultura tradicional, e a tentativa de lhe dar um sentido e rendimento capaz de complementar a atividade agrícola foi o verdadeiro objetivo e incentivo”, acrescenta a responsável.
Colina dos Piscos aposta nos eventos e workshops
Aberta desde há apenas dois anos, em 2017, a Colina dos Piscos, cujo nome deriva de uma ave de pequeno porte, com uma mancha laranja no peito que é comum na região, tem vindo a registar um “crescimento progressivo” e um “desempenho diversificado”, “depois de uma explosão de procura” que se seguiu à abertura, com Filipa e Jorge Castelão a explicarem ao Publituris que o crescimento tem estado também associado “a outras atividades complementares, nomeadamente os eventos e os workshops”. É que além da casa em estilo romântico, do século XIX, onde existem seis quartos para alojamento, a Colina dos Piscos dispõe também da “casa das artes”, um espaço onde são realizados diversos workshops de arte, desde fotografia a artesanato, e organiza os mais diversos eventos, desde casamentos a fins-de-semana de teambuilding, que tanto podem decorrer nos jardins da propriedade, no palheiro, na eira ou junto ao lago.