Edição digital
Assine já
PUB
Opinião

Nos 30 anos da ESHTE: a necessária clarificação

Carlos Torres, jurista e professor na ESHTE

Opinião

Nos 30 anos da ESHTE: a necessária clarificação

Carlos Torres, jurista e professor na ESHTE

Carlos Torres
Sobre o autor
Carlos Torres

O terreno foi comprado em 1982, com as verbas da região, para a construção da ESHTE e a cessão do Estado para o INFT, 12 anos mais tarde, exclusivamente com essa finalidade. Passados 30 anos, se se mantiver o grosseiro incumprimento por parte do TP, impõe-se a solução da reversão para o Estado.

 

A comemoração dos 30 anos da ESHTE ocorre num contexto incompreensível em razão das intempestivas obras em curso não permitirem, em setembro, uma abertura normal do ano escolar, como seria imposto por uma adequada planificação e, sobretudo, ponderação e respeito pelo interesse dos milhares de estudantes.

 

Nascida duma ideia pioneira ao nível mundial – o ensino superior do turismo – e germinada em 1977 no órgão local de turismo, a Junta de Turismo da Costa do Estoril, a ESHTE não tem tido uma vida fácil, sobretudo devido às instalações não serem da sua propriedade como se impunha, sendo a instituição fortemente condicionada, desde o seu nascimento, pelo então INFT, depois INFTUR, atualmente Turismo de Portugal (TP).

 

Sucede que o terreno foi adquirido em 1982, à família Pereira Coutinho com verbas da região, de harmonia com o plano de obras, para a construção da ESHTE. Acresce que a cessão do Estado para o INFT, em finais de 1994 – aquando da aquisição do terreno, a ESHTE era um projeto, não tinha personalidade jurídica – teve uma finalidade única, expressa e inequivocamente indicada: a construção da ESHTE. De harmonia com a lei para a qual a cessão do Estado para o INFT expressamente remete, se aos bens cedidos não for dado o destino que justificou a cessão, pode ocorrer a reversão do terreno para o Estado Português, não tendo o cessionário, salvo caso de força maior, direito à indemnização por benfeitorias realizadas. Ou seja, mesmo admitindo-se – podem suscitar-se dúvidas neste domínio, mercê das sucessivas pessoas coletivas de direito público INFT, INFTUR, TP – que tenha havido transmissão ex lege da propriedade para o TP, os factos que podem determinar a reversão são inúmeros.

 

Desde logo, a amputação duma parte importante do terreno para o ténis, para permitir à Câmara de Cascais a construção do centro de congressos, a perda da valiosa parcela do lado de lá da autoestrada por exclusiva responsabilidade do INFT que o declarou sem interesse (o seu valor atual permitiria construir vários edifícios, e sobretudo a instalação dum hotel-escola com vista para o golfe e ligação ao campus através de uma ponte que atravessa a autoestrada, há muito construída expressamente para o efeito), a fortíssima degradação do campus com toda a sorte de consequências para os alunos, maxime o encerramento do valiosíssimo bloco do alojamento, privando um elevado número de jovens de todo o país e mesmo do estrangeiro de a frequentarem, a supressão do estacionamento, obrigando-os a percorrer à chuva uma significativa distância e comprometendo inclusivamente a sua segurança, e o incompreensível não fornecimento de jantares num estabelecimento desta área, são algumas das surpreendentes diatribes institucionais.

 

Nunca entendi a razão pela qual não se opta pura e simplesmente pela recuperação do edificado existente, recuperando os espaços verdes em vez da sua betonização extrema. Com as milionárias verbas já gastas em projetos, tudo estaria impecável e com perturbações mínimas de alunos, docentes e funcionários, permitindo também a preservação da arquitetura desta inovadora iniciativa mundial. O período da pandemia teria sido uma ocasião de ouro para a sua implementação, como tantas instituições e empresas do sector do turismo fizeram. Porquê obrigar o órgão máximo da ESHTE a reunir à distância num curto período para, passadas as eleições de 2019, se entrar na mais completa inação?

 

O importante artigo de Bernardo Barros, presidente do Turismo de Cascais, sobre as verbas do jogo é um elemento mais do que suficiente para abalar toda a credibilidade da autoridade turística nacional neste domínio, e a ausência do Ministro do Ensino Superior na solução do campus é outro fator da maior perplexidade.

 

Por fim, o edifício proposto, cuja gestação ocorreu numa extraordinária opacidade, só se conhecendo recentemente as suas linhas gerais, sem qualquer dimensão arquitetónica ou espacial, é uma mini ESHTE convenientemente partilhada com o Centro de Excelência (interrogo-me se Roma pagará ao traidor que ambiciona a sua presidência).

 

Para cúmulo, a ESHTE continuará a ser vilipendiada ao não ser proprietária dessa acantonada solução, apenas utilizando as instalações precariamente durante 50 anos, sem que haja a garantia da tutela – o Ministro do Ensino Superior nada assinou – de transferir as verbas indispensáveis para o funcionamento do novo edificado que em termos arquitetónicos contrasta grosseiramente com os demais edifícios.

 

Em suma, o terreno não foi adquirido, as instalações não foram financiadas e a cessão não foi efetuada para qualquer finalidade do INFT | INFTUR | TP mas tão somente para a construção da ESHTE. Aspeto que, surpreendentemente, não tem sido minimamente valorizado e esgrimido. O tempo, esse grande escultor (Marguerite Yourcenar) só agravou, neste trinta anos, a vida institucional da ESHTE.

 

Sobre o autorCarlos Torres

Carlos Torres

Jurista e professor na ESHTE
Mais artigos
PUB
PUB
PUB
PUB
PUB
PUB
PUB
PUB
PUB
PUB
PUB
PUB

Navegue

Sobre nós

Grupo Workmedia

Mantenha-se informado

©2021 PUBLITURIS. Todos os direitos reservados.