Turismofobia. “Creio que se está a actuar de forma irresponsável”
Em entrevista ao Publituris, o presidente da Hotusa fala do investimento em Portugal, do BREXIT e da Turismofobia.
Carina Monteiro
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Em entrevista ao Publituris, o presidente da Hotusa fala do investimento em Portugal, do BREXIT e da Turismofobia.
Foram necessários quatro anos de obra para pôr de pé o Eurostars Museum, unidade de cinco estrelas do Grupo Hotusa em Lisboa, e um forte candidato a hotel emblemático do grupo no País. De passagem por Portugal, e em entrevista ao Publituris no início de Fevereiro, Amancio Lopez Seijas, presidente do Grupo Hotusa, mostrou-se satisfeito com o resultado final da unidade, que é simultaneamente um museu. Com um acervo que retrata os diferentes séculos da história da cidade, o hotel foi cuidadosamente construído num edifício na Rua Cais de Santarém. “Os hotéis têm de ser um escaparate das cidades onde estão localizados. Este hotel resume a história de Portugal, desde os Fenícios até à actualidade, passando pela Época Romana, Árabe, Idade Média, Renascimento, Descobrimentos, o terramoto de 1755. Parece-me que é importante que um hotel mantenha uma ligação à cidade e, neste caso, tentámos respeitar a ligação deste lugar a Lisboa”, começa por dizer.
Sem revelar o valor do investimento no hotel, que é propriedade e gestão da Hotusa, Amancio Lopez Seijas refere, apenas, que se tratou de “um investimento muito elevado” por quarto. “Pensamos que mereceu a pena. Apesar de ter levado muito tempo a construir e muitas dificuldades, acreditamos que o investimento será recuperado, os clientes saberão entender a diferença entre um hotel que não foi feito baseando-se apenas no critério de rentabilidade económica, mas também de responsabilidade para com a cidade. Estamos confiantes que os nossos clientes valorizarão isso”, refere.
Portugal é já o segundo país, a par de Itália, onde a Hotusa tem mais unidades. Além de estar “satisfeito com a operação” no País, o presidente do grupo acredita que dentro de alguns anos Portugal “vai destacar-se ainda mais dentro do portefólio da marca”. “Portugal é um destino com um enorme potencial. Creio que, na Europa, deve ser o País que mais cresce, juntamente com Espanha. Estão a crescer, basicamente, porque têm os factores fundamentais: segurança, infraestruturas e, sobretudo, à semelhança de Espanha, tem um estilo de vida, desde o clima, à cultura, à tradição e às pessoas. Para resumir, é um sítio onde os turistas se sentem seguros e se divertem, que é, no fundo, o que pretendem”. O responsável não tem dúvidas que o País “está e vai continuar a sofrer uma enorme transformação”, não só através do Turismo de Lazer, de Sol e Praia, mas também através do Turismo Urbano e Cultural. “Com a riqueza cultural que têm cidades como Lisboa e Porto, e outras cidades que têm a sua singularidade e identidade, estou confiante que isso permitirá ao País um crescimento a longo prazo”.
Foi há 12 anos que o grupo espanhol abriu a sua primeira unidade hoteleira em Portugal, mas, muito antes disso, já operava com a sua central de reservas. Nessa altura, Amancio Lopez Seijas já considerava Lisboa e Porto cidades “de grande interesse turístico, porque tinham todos os requisitos”. Aquilo que não passava de uma intuição transformou-se em realidade. “O crescimento acelerou e agora estão nesse nível”, refere.
Aberturas
Depois da abertura do Eurostars Museum, a Hotusa tem mais cinco unidades para abrir em Lisboa: dois hotéis propriedade da empresa no Parque das Nações, que se encontram em fase de construção; e mais dois hotéis que não são propriedade, mas arrendamento. “Um esperamos recebê-lo a meio de Junho, na Av. Duque de Loulé. E o outro na Av. Defensores de Chaves. Recentemente, comprámos também um edifício na Rua da Prata, na Baixa de Lisboa, que será um hotel boutique”, explica. No Porto, o grupo espanhol vai abrir um cinco estrelas no antigo edifício AXA, um prédio de apartamentos turísticos na Rua Sampaio Bruno e um quatro estrelas em Matosinhos.
Apesar da maioria dos projectos da Hotusa estarem concentrados nos centros urbanos de Lisboa e Porto, Amancio Lopez Seijas afirma que grupo tem olhado para outras cidades. “Temos interesse em cidades como Coimbra e Braga, que têm uma enorme riqueza cultural. Também temos interesses nos destinos de lazer, como a costa de Lisboa e o próprio Algarve.”
Quanto às dificuldades do País para quem quer investir, Amancio Lopez Seijas, refere que, “como em todos os países do Sul da Europa, são a burocracia e a lentidão na obtenção de licenças”. “Pôr em marcha uma obra é muito complicado, mas é algo que acontece em Espanha, em Itália, nos países do Sul da Europa. Provavelmente é algo que todos os países do Sul da Europa têm de melhorar e agilizar. Quando há uma empresa que é viável, que cria riqueza e postos de trabalho, devia-se agilizar o processo.”
Questionado sobre a subida de preços na hotelaria em Portugal, o presidente da Hotusa explica que se trata de um ciclo. “Agora estamos num ciclo positivo em que os preços subiram e, logicamente, a rentabilidade melhorou. Mas isto é cíclico. Quando as coisas estão bem, constroem-se muitos hotéis, quando há muitos hotéis, a rentabilidade baixa e deixa-se de construir. Passado algum tempo, voltam a ser rentáveis e assim sucessivamente. Estamos numa fase ascendente, mas o importante é as cidades manterem a sua identidade”, afirma. “Creio que as cidades espanholas, como as portuguesas e outras, devem manter a sua singularidade, os seus estabelecimentos emblemáticos, a sua história, para que quem venha a Lisboa, perceba claramente que está em Lisboa e encontre toda a tradição da cidade”, defende. Para o responsável é importante que se aposte em “hotéis de design, inovadores e de qualidade, que possam eles próprios converterem-se em destinos”. “Por isso pensamos que, o que fizemos nesta unidade [Eurostars Museum] é importante, porque não é um hotel normal, com um design simplesmente estético, neutro. Este é o caminho.”
Planos de expansão
Amancio Lopez Seijas afirma que o Grupo Hotusa está empenhado em crescer em quase todas as partes do globo, incluindo no Velho Continente, “Estamos a olhar praticamente para toda a Europa: a tradicional e turística, estou convencido que países como a Alemanha têm um enorme potencial turístico, como Portugal, pela cultura, história e singularidade”.
A América, não só a Latina, como a do Norte, também interessam aos planos de expansão do grupo. Já sobre os outros continentes, o responsável refere: “Acreditamos que África oferece enormes oportunidades. Um pouco mais complicado é o desenvolvimento na Ásia, porque chegámos um pouco tarde. Tudo consiste em saber fazer um produto diferenciado, competitivo e eficiente. Tendo isso, podemos replicá-lo noutros destinos, países e continentes. Num mundo global, a competitividade consiste nisso: se sabemos fazer algo, podemos levá-lo a qualquer sítio”.
Em 2017, as vendas do grupo Hotusa cresceram ligeiramente acima dos 15%. Embora os números ainda não estejam fechados, as receitas devem subir também acima dos 15%. Em Portugal, o crescimento foi acima 20%, refere o responsável.
Com vários hotéis na Catalunha, os reflexos da instabilidade política na região no último trimestre de 2017 tiveram um impacto negativo nas unidades. Efeito que parece estar a ser revertido já no início deste ano. “Não me atrevo a fazer prognósticos, sobretudo quando existe incerteza e pode haver instabilidade. Como sou empresário, sou optimista, espero que, no final, o sentido comum e a lógica prevaleçam e que os problemas se revolvam da melhor forma possível”.
Já quanto à saída do Reino Unido da União Europeia e o efeito que isso pode ter nas viagens do mercado inglês, as palavras são de incerteza. “Até aqui, tivemos um período onde parecia que todos os projectos consistiam em construir pontes, unir, somar. E o Brexit é um fenómeno em direcção contrária. O preço da libra é uma das maiores incertezas. Em contrapartida, temos que captar mercados de outras origens para, de certa forma, compensar o mercado inglês. Creio que a chave será o câmbio da libra e o poder aquisitivo dos ingleses”.
Concorrência e Turismofobia
Sobre o ressurgimento do Turismo nos países da bacia do Mediterrâneo, Amancio Lopez Seijas faz a seguinte leitura: “Temos que, em primeiro lugar, reconhecer que parte deste crescimento do Turismo de férias, que nada tem a ver com o crescimento do turismo nas cidades, é proveniente da quebra de destinos como o Egipto, Tunísia e Turquia. Agora, com uma política de promoção, de baixa de preços e um certa normalidade face aos ataques terroristas, esses países estão a ganhar quota de mercado novamente e, logicamente, vai afectar-nos. Temos que aceitar isto como algo normal”, defende. Por outro lado, o presidente da Hotusa afirma que Portugal e Espanha têm de se posicionar pela qualidade. “Temos que apostar num produto de qualidade, não podemos apostar pelo preço. Isso é impossível e incompatível com a melhoria da qualidade de vida e o nível de vida e rendimento dos nossos trabalhadores. Não podemos baixar os salários. Em Espanha e em Portugal temos segurança, boas infraestruturas e melhores estilos de vida, temos de ter um produto de qualidade. Creio que Portugal também se caracteriza por ter um nível de serviço, de qualidade humana e de atenção ao cliente que muitas pessoas que vêm a Portugal valorizam. Isso é fundamental para que quem venha se sinta em casa e repita”.
O último tema da conversa com Amancio Lopez Seijas foi sobre a Turismofobia, com o presidente da Hotusa a considerar que o fenómeno nasce “com algumas gestões irresponsáveis”. “Quando se penaliza o Turismo que é uma das actividades económicas mais transversais, mais importantes, mais saudáveis, que permite que a marca de um país se posicione internacionalmente, creio que se está a actuar de forma irresponsável”. O responsável diz que os destinos precisam de decidir que tipo de Turismo querem, porque as capacidades de carga do território não são infinitas. “Pretendemos um modelo de negócio regulado, que crie emprego, riqueza e que é seguro. Ou preferimos um modelo desregulado, que não paga impostos, não cria riqueza, nem cria emprego. Dizer que é uma economia colaborativa é um eufemismo para disfarçar uma economia subversiva. Temos que ser pragmáticos e defender o que funciona bem e o que cria riqueza. Não sei qual é o número de turistas que os destinos podem receber, mas sei que há um número máximo, não é infinito. Temos que decidir se queremos um Turismo de cinco e quatro estrelas, que quando sai à rua vai aos restaurantes, às lojas, compram, e toda a cidade beneficia. Ou preferimos um tipo de turista que fica num apartamento com um monte de pessoas, compra no supermercado e faz uma festa. No final há que eleger”, defende. “Creio que as políticas devem consistir em fixar as estratégias de futuro e definir o que queremos ser. Não quer dizer que não deva haver este tipo de turismo, de gente mais jovem, o que digo é que não se pode penalizar o modelo que gera mais riqueza. Há que regular e fixar uma estratégia”, conclui.