Conversas à Mesa | Vitor Costa
Vitor Costa, director-geral do Turismo de Lisboa e presidente da Entidade Regional de Turismo da Região de Lisboa, foi o convidado do Conversas à Mesa que decorreu no Restaurante Tágide.
Carina Monteiro
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Não haveria melhor pano de fundo do que Lisboa para um Conversas à Mesa com Vitor Costa. Na varanda do restaurante Tágide encontrámos uma vista privilegiada sobre a cidade, à qual o director-geral do Turismo de Lisboa (ATL) dedicou grande parte da sua carreira. Primeiro como vereador, depois como fundador e dirigente da ATL.
Mas não se pense que Vitor Costa nasceu em Lisboa. Nascido em Cercal do Alentejo, em 1954, foi lá que estudou até ao antigo segundo ano do liceu.
Recorda-se da bata branca que a mãe costurou e da pasta comprada num artesão. No primeiro dia de escola lá foi de bata vestida e pasta na mão, muito orgulhoso da sua condição. A imagem valeu-lhe um elogio da mãe “Que lindo! Pareces um doutor”.
Era bom aluno, até porque tinha um bom método: “Vinha para casa e fazia logo os trabalhos, só depois saía para brincar na rua com os outros miúdos”.
Nas férias costumava ir com a mãe para Sines. “Sines era muito cosmopolita na altura. Havia barraquinhas na praia, restaurantes, tinha dois cinemas. Íamos ver a ‘Marisol y o Joselito’, chorar e comer pevides”, brinca.
Desde cedo que aprendeu a adaptar-se às condições. O primeiro desafio foi ir estudar para Santiago do Cacém, só vinha aos fins-de-semana a casa. Com 12 anos foi partilhar um quarto com um colega que era da mesma terra. Depois foi para o Liceu Nacional de Setúbal, onde completou o 6º e o 7º ano. Nessa altura já só vinha de férias a casa. “Foram tempos de grande movimento e libertação. Às vezes vinha a Lisboa com os amigos”, recorda.
Costumava dizer que queria ser engenheiro, mas o pai queria que fosse advogado. Acabou por escolher Direito, mas o pai só descobriu quando o acompanhou a Lisboa para se inscrever na Faculdade de Direito, em 1971. Terminou os estudos em 1976, já depois do 25 de Abril. “A faculdade de Direito era um palco bastante vivo da política. Também me embrenhei nessas lutas políticas”.
Depois de terminar o curso, ingressou na Escola Prática de Artilharia, em Vendas Novas. Terminado esse período, veio para Lisboa e começou a trabalhar. Montou um escritório com um colega, na Rua do Carmo. A sogra do colega dispensou dois quartos da sua casa para fazer o escritório de advogados, em 1978.
Depois saiu para um escritório na Rua de São Julião e, mais tarde, na Rua Pinheiro Chagas. Foi advogado durante 13 anos. Dedicava-se sobretudo a questões de direito administrativo, penhoras, questões laborais e questões de habitação. Foi advogado laboral de vários sindicatos e da Associação de Inquilinos Lisbonenses. Fez uma Sociedade com os advogados Santos Nunes e João Correia, que chegou a ser secretário de Estado da Justiça. Seguiu-se a Câmara Municipal de Lisboa.
Câmara Municipal de Lisboa
Vitor Costa era advogado do sindicato dos trabalhadores do Município de Lisboa, desde o seu início, em 1978. Também dava apoio ‘ro bono a alguns vereadores do PCP em relação às suas actividades na Câmara. Em 1985, foi convidado para a lista do PCP à Câmara Municipal de Lisboa, liderada por Carlos Carvalhas. Aceitou e foi o número cinco da lista, o mesmo número de vereadores que o PCP conseguiu eleger. A Câmara acabou por ser ganha por Nuno Krus Abecasis, com o apoio do CDS e do PSD.
“Fiquei quatro anos na oposição ao Eng. Abecasis. Era uma altura difícil, porque a cidade estava muito provinciana, com muitos bairros de barracas, os bairros históricos a cair. Havia uma luta política forte contra a gestão da altura, que era muito casuística, pouco ligada a planos e a regras de urbanização”, recorda. “Foi interessante, porque estava-se a preparar uma alternativa para uma cidade mais cosmopolita e adequada a uma capital europeia”, remata.
Em 1989, a coligação histórica entre PS e PCP levou à eleição de Jorge Sampaio para a presidência da CML contra o seu principal opositor, Marcelo Rebelo de Sousa. “Nessa altura, o nível de debate político foi bastante elevado”, reconhece. A coligação tomou posse em 1990 e Vitor Costa ficou com a pasta do Turismo. Começava aqui o seu percurso nesta área que nunca mais largou.
“No último mandato do Eng. Abecasis, tinha havido uma tentativa de fazer do Turismo uma coisa mais séria. Na altura, o Dr. Vitor Gonçalves começou a fazer algumas coisas. Mas para se ter uma ideia, até aí o vereador do Turismo era o vereador dos cemitérios. Aquilo não dava votos”, constata.
Tinha o pelouro do Turismo e do Ambiente e na Câmara havia um projecto de fazer um plano estratégico para Lisboa. “O benchmarketing era Barcelona”, conta.
Momentos marcantes há muitos. O primeiro, logo em 1990, com a criação das Festas de Lisboa, que ficaram a cargo de Vitor Costa e também de Miguel Portas, que era assessor de Jorge Sampaio. No primeiro ano trouxeram os Rolling Stones que actuaram no Estádio José Alvalade. “Ninguém aceitava fazer o seguro da relva e, sem o seguro, o Sousa Cintra [presidente do Sporting na altura] não deixava entrar os camiões”, recorda.
Associação de Turismo de Lisboa
Em 1997, já depois da cidade ter sido Capital Europeia da Cultura [em 1994], e de ter acolhido o Congresso Mundial da ASTA (American Society of Travel Agents), também em 1994, discutia-se a Expo 98. Os hoteleiros estavam preocupados com o que iria suceder após a exposição mundial.
O benchmarketing continuava Barcelona, que tinha criado o Turismo de Barcelona na altura dos Jogos Olímpicos. Vitor Costa viajou em 1997 até Barcelona para se reunir com os seus congéneres e perceber a criação daquela entidade.
É preciso referir que Lisboa já tinha sido palco do congresso da ASTA. Para isso, constituiu-se na altura um grupo de trabalho entre o sector público e privado. “O grande motor da vinda deste congresso foi o Rui Horta que era o presidente do capítulo português da ASTA e dono da Top Tours”, lembra, referindo também outros intervenientes, como Luís Correia da Silva e Armando Rocha.
Regressado de Barcelona, falou com o presidente da Câmara Municipal de Lisboa, João Soares, que respondeu afirmativamente ao repto. Depois falou com Rui Horta e propôs-lhe fazer uma associação, ele trabalharia a parte dos privados. “Em Julho, um mês depois da viagem a Barcelona, já estávamos a fazer o primeiro protocolo com a AHP, a APAVT e o GICOL (Lisboa Convention Bureau). No final de 1997, a Associação de Turismo de Lisboa (ATL) já tinha estatutos, local, já tinha havido eleições e já estávamos a começar a trabalhar no primeiro plano estratégico”, conta.
Desse primeiro plano, Vitor Costa destaca o trabalho feito na comunicação de Lisboa junto dos mercados europeus. “Pela primeira vez, em 1999, contratámos agências de comunicação em vários países europeus, além de parcerias com operadores turísticos, press trips, fam trips”. Quanto à verba disponível, Vitor Costa sublinha o papel da Câmara. “A Câmara durante os primeiros dez anos da ATL apostou o correspondente a cinco milhões por ano”.
Sobre os 20 anos passados, Vitor Costa faz questão de dizer que houve continuidade dos planos estratégicos da ATL, “sempre com novos patamares e coisas inovadoras”. No plano de 2003, a questão que se impunha eram as low cost. “Quem trouxe para cá a easyJet fomos nós na sequência desse plano. A Paula Oliveira foi bater à porta dos escritórios da easyJet em Luton e reuniu com eles. Em 2004, começaram as primeiras rotas em Lisboa. A base veio em 2008 já com a participação do Turismo de Portugal”, lembra. Em 2007, o foco foi a promoção online. “Foi a grande prioridade do plano de 2007”, mas não foi a única. “Quando o António Costa entrou para a Câmara, a Câmara tinha pouco dinheiro e na altura acordou connosco outra estratégia, não podia continuar a pagar o dinheiro que pagava. Tínhamos de encontrar projectos de desenvolvimento turístico que permitissem à ATL ter recursos. O mais importante foi a reconversão do Terreiro do Paço, fizemos as obras, as concessões dos restaurantes, e hoje o Terreiro do Paço é aquilo que se vê.”
Acredita que o Turismo na cidade é “um projecto conseguido”, com tendência para se manter. “Houve um alargamento do mercado, uma democratização, as pessoas começaram a considerar as viagens como uma necessidade básica. Lisboa atingiu um patamar de notoriedade que é quase inevitável. Antes falava-se em pagar ao Woody Allen para vir filmar a Lisboa, agora não é preciso, agora querem comprar casa aqui. Isto ganhou uma dinâmica que acho que Lisboa atingiu o seu objectivo”.
E o que tem a dizer sobre as pessoas que afirmam que Lisboa tem turistas a mais? “A maior parte diria que é por pedantismo que o diz. Se perguntasse a essas pessoas onde foram passar fins-de-semana, se calhar respondiam-me que foram a Barcelona ou a Amesterdão. Ninguém está contra o Turismo, estão contra a democratização do Turismo. Por formação, penso que a democratização do Turismo é uma coisa boa, mais pessoas têm acesso a coisas positivas. Antes as pessoas também não iam viver para as zonas históricas, tive esse pelouro na Câmara, na altura os jovens não ficavam nesses bairros.”
Aos 63 anos, está consciente que se aproxima a retirada de cena. “Não tenho nenhum estado de alma por qualquer dia ter de me ir embora. É a vida. Encaro isso naturalmente. Em todos os capítulos da minha vida, quando passo a página, nunca mais me lembro”, afirma.Família e hobbies
Vitor Costa é casado com Paula Oliveira, com quem tem uma filha, Inês, de 18 anos. Do primeiro casamento tem um filho, João, com 36 anos, que por sua vez foi pai de uma menina, Helena, no início do ano, a única neta de Vitor Costa. Nos tempos livres, gosta de andar de mota – uma paixão antiga -, petiscar, estar com os amigos, ler, ir ao cinema. Há dezasseis anos que passa férias em Porto Santo, onde a família comprou casa. Viajam todos anos para conhecer uma cidade, mas este ano ainda não o fizeram. Sente-se bem em Lisboa, mas também aprecia sítios com menos barulho. “Não sou tão urbano como a minha mulher. Ela é completamente”, confessa. Ainda vai ao Alentejo, onde tem casa e família, ou a Santa Cruz, onde também tem casa. Aí aproveita para jardinar, tratar de alguma mudança, actividade que também aprecia.
Restaurante Tágide
Situado no coração do Chiado, o Restaurante Tágide continua a ser um dos mais emblemáticos restaurantes lisboetas, possuindo uma das mais belas vistas de Lisboa e do rio Tejo, e primando por um serviço de excelência e pelo misticismo do espaço com painéis de azulejos e lustres do séc. XVIII. A estas mais-valias com um carácter único, junta-se agora a assinatura do chef Gonçalo Costa, que traz uma visão diferenciadora e arrojada, resultante do seu percurso. Recentemente, o Restaurante Tágide adicionou à sua oferta uma nova esplanada. Aberta todos os dias de segunda a sábado, a nova esplanada “Um Eléctrico chamado Tágide” tem uma carta que espelha a inspiração nos sabores e aromas que nos transportam para a época dos descobrimentos portugueses.