Opinião|Vítor Neto “Turismo- Em que ficamos? Conjuntura? Bolha? Os melhores do Mundo?”
Leia a opinião por Vítor Neto, empresário e gestor, presidente do NERA, Associação Empresarial da Região do Algarve.
Publituris
10.ª edição do “Vê Portugal” aposta nos desafios futuros das ERT e na paz para o turismo
ARAC reúne em assembleia geral para discutir plano de atividades e orçamento para 2024
Agência Abreu aposta em viagens premium de enoturismo
Savills aponta para aumento do volume de investimento em hotéis europeus face a 2023
Negócios no setor das viagens e turismo caíram 14,9%
Macau facilita entrada de portugueses com passagem automática na fronteira
easyJet corta voos para Israel até outubro
W Algarve tem novo diretor-geral
Nações Unidas discutem papel do turismo para o desenvolvimento sustentável
Quinta de S. Sebastião abre portas ao Enoturismo
É verdade: as previsões dos resultados do Turismo para o ano em curso são muito positivas em praticamente todos os índices.
Não é uma surpresa: vêm na continuidade e confirmam os resultados dos últimos anos. Ótimo. Devemos manifestar satisfação e divulgar o mais possível. Creio, no entanto, que não se justifica o exagero delirante de algumas notícias e comentários, onde tudo se mistura sem nexo, contrariando alguns sinais de maior equilíbrio nas referências ao Turismo, que já se vinham verificando e que aqui referi no artigo anterior. Enganei-me. Importa continuar a batalha de esclarecimento.
Como se pode afirmar, por exemplo, que «até abril Portugal recebeu mais de cinco milhões de turistas estrangeiros»? Ou que vamos receber este ano 20 ou 21 milhões de turistas estrangeiros? Que números são estes? Que efeitos têm na opinião pública?
Há aqui um equívoco. Trata-se de valores que têm por base o número de «hóspedes» (19 milhões em 2016 e cinco milhões até abril/17-INE), mas com um pormenor: esses valores incluem os hóspedes «nacionais» e os «estrangeiros», correspondendo estes a cerca de 60% (2016 – INE).
Para quê estas abordagens simplistas? Para quê as referências banais ao «petróleo», à «galinha dos ovos de ouro», à «bolha»? À exaltação provinciana do destino que mais cresce, ou de nos acharmos os melhores do mundo? O que é que adianta? Uma primeira consideração, que é um alerta: a subestimação e a menorização do Turismo, no fundo, mantêm-se e continuam a manifestar-se das mais variadas formas.
Na Economia, manifesta-se através da desvalorização do seu contributo para o PIB (10%) e para as Exportações (16,7% do total). Poucos o dizem. Há quem não consiga digerir que o Turismo é, há vários anos, o principal setor exportador de Bens e Serviços de Portugal (12.700 Milhões €/2016).
Na Política, o Turismo conta ainda com outro palco: partidos da oposição ao Governo tentam diminuir o significado do crescimento da economia em 2016, dizendo que ele se deveu «sobretudo ao Turismo», que, segundo eles, só cresceu graças à «conjuntura» internacional. Isto é, o Turismo, em si, de pouco vale. Por outro lado, o que não deixa de ser curioso, verifica-se que responsáveis governamentais, para se defenderem da «acusação», dizem que o Turismo deu, sim, o seu contributo, mas não foi pela «conjuntura», pois o seu crescimento verificou-se não no Algarve (que beneficiaria mais da crise do Médio Oriente), mas em Lisboa e no Norte do País (debate na AR, 23 de maio 2017). O que a realidade dos números não confirma.
De facto, se falarmos de exportações e tomarmos como referência as dormidas dos estrangeiros, o Algarve em 2016 cresceu 1,5 milhões de dormidas. Foi a região que mais cresceu: quase 40% do total nacional. Um valor que representa mais do que o crescimento de Lisboa e Norte juntos (812,5 + 587,5 = 1,4 milhões). Números do INE.
É um facto que o Turismo dos estrangeiros cresceu em todo o País, em todas as regiões, o que deve ser salientado, mas cresceu de forma diferente e com significados específicos, que devem ser referidos para evitar erros de estratégia, pública e privada. Na realidade, a subestimação da importância do Turismo na economia continua, e a avaliação diferenciada das regiões é, em geral, ignorada.
Outra questão relevante hoje no Turismo: Lisboa.
A realidade do Turismo na capital do País suscita algumas reflexões e deve ser abordada com seriedade. Deve-se, no entanto, evitar o erro de fazer disso o centro da problemática nacional do Turismo, que é mais vasta e diferenciada.
Lisboa (o nosso segundo maior destino de turistas estrangeiros) tem tido um crescimento muito forte nos últimos anos. O que tem vindo a gerar discussões e polémicas sobretudo em dois aspetos: o «excesso» de turistas e o alojamento local.
Lisboa, um extraordinário destino turístico urbano, não é caso único na europa, está a viver uma pressão e uma experiência como outras importantes cidades (Barcelona, Madrid, Paris, etc.).
Trata-se de uma problemática nova, muito complexa, que tem que ser abordada com inteligência e equilíbrio.
Mas os responsáveis políticos foram adiando porque os interesses em jogo são muito variados – residentes locais, arrendatários tradicionais, alojamento local familiar e alojamento local com dimensão empresarial; interesses imobiliários, hotelaria, comércio, restauração, transportes, etc.. Com vários atores: Município, Juntas de Freguesia, Partidos políticos, Governo, Associações. E eleições. Interesses muitas vezes contrastantes. Seria um erro fingir que não existem.
As autoridades municipais não enfrentaram a tempo a nova realidade. Perderam o controlo da situação. Agora é difícil encontrar respostas que agradem a todos.
Corre-se o risco de medidas pontuais (legislação ambígua) apenas para adiar o problema, estimulando atitudes pouco ponderadas de apoio ou rejeição. Estamos perante uma problemática nova com possíveis diferentes ângulos de abordagem teórica: «As grandes cidades e o Turismo» ou «O Turismo nas grandes cidades». Coisas diferentes. Exigem reflexão.
As Regiões são todas diferentes. Os Turistas também
Não se pode «refletir sobre turismo» partindo apenas de uma realidade, seja ela Lisboa ou Algarve, Porto ou Alentejo.
O Turismo, insisto, exige em primeiro lugar uma abordagem global/nacional, uma visão estratégica para o País. Mas deve saber integrar as realidades regionais e locais – todas importantes, mas diferentes, mesmo as que podem parecer iguais. Cada região tem o seu território, a sua localização e acessibilidades, os seus recursos e produtos, as suas ofertas e potencialidades. Que geram uma procura específica, dirigida a um perfil de clientes adequado, turistas todos diferentes mesmo quando parecem iguais. E que, quando se deslocam às várias regiões, sendo os mesmos, têm comportamentos diferentes. É o Turismo.
É esta reflexão que, por interesses e motivações de natureza diferente, não se quer fazer. Mas que é urgente, para evitar o risco de não nos prepararmos a tempo para os desafios que o futuro nos coloca.
*Por Vítor Neto, empresário e gestor, presidente do NERA, Associação Empresarial da Região do Algarve