SEXO, TURISMO E MISÉRIA
por Mendes Bota,Não é apenas na desigualdade de rendimentos, que Portugal aparece nos tops internacionais pelos piores motivos. O extraordinário trabalho jornalístico de Isabel Nery, publicado pela revista Visão há dias atrás, intitulado “Crianças, vendem-se”, constitui uma verdadeira pedrada no charco dos bons costumes nacionais, e desta letargia cívica de consentimento e passividade, com muita… Continue reading SEXO, TURISMO E MISÉRIA
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por Mendes Bota,Não é apenas na desigualdade de rendimentos, que Portugal aparece nos tops internacionais pelos piores motivos. O extraordinário trabalho jornalístico de Isabel Nery, publicado pela revista Visão há dias atrás, intitulado “Crianças, vendem-se”, constitui uma verdadeira pedrada no charco dos bons costumes nacionais, e desta letargia cívica de consentimento e passividade, com muita hipocrisia à mistura, da sociedade portuguesa. O Brasil, esse nosso país irmão, esse gigante que começa a levantar-se, está entre os principais produtores mundiais de carne humana barata e infantil. E os portugueses, estão entre os seus principais clientes. Desde há pelo menos dez anos, quando se escancararam as portas da ponte aérea entre Lisboa e o Rio de Janeiro, ou São Paulo, ou Salvador, ou Porto Seguro, ou Fortaleza, que se ouvem contar proezas de recorte machista, sobre bacanais e distribuições de sémen ao sabor da carteira, da vontade e da imaginação. Ah, grande Brasil, terra de oportunidades, paraíso para investidores, novo eldorado sem minas de ouro, cada cavadela imobiliária salta um tesouro, eis que aí vão e vêm paletes de empresários, muito no masculino como convém, com programas onde não raras vezes se misturam negócios com sexo pago e, confirma-se agora o que já circulava, não apenas sexo entre gente adulta, mas o tipo de sexo mais abjecto e repugante, com crianças roubadas à vida, num carnaval que alimenta a miséria descomunal das famílias e o negócio milionário da droga.
Esta associação do Brasil, como mercado turístico de destino, e de Portugal, como mercado emissor de clientela, deve merecer urgentemente uma reflexão muito séria entre os responsáveis políticos e empresariais do sector sobre esta triste realidade. Políticos, hoteleiros, agentes de viagens, transportadores, sindicatos e associações patronais dos dois países, deveriam reunir-se urgentemente, para analisar um fenómeno crescente, e adoptar medidas legislativas e boas práticas éticas, que ajudem a limpar esta mancha de um negócio que deve ser saudável, em benefício de todos. Está na altura de colocarem os olhos no Código Global da Ética para o Turismo, aprovado pela World Tourism Organisation em Santiago do Chile, em Outubro de 1999. E, muito particularmente, nos parágrafos 2 e 3 do Artigo 2º que se transcrevem:
“As actividades turísticas devem respeitar a igualdade de homens e mulheres; devem promover os direitos humanos e, muito particularmente, os direitos individuais dos grupos mais vulneráveis, designadamente, crianças, idosos, deficientes, minorias étnicas e povos indígenas.
A exploração de seres humanos por qualquer forma, particularmente sexual, especialmente quando aplicada com crianças, conflitua com os objectivos fundamentais do turismo e é a negação do turismo; assim, no respeito pelas leis internacionais, deve ser combatida energicamente com a cooperação entre todos os Estados envolvidos, e penalizada sem contemplações na legislação nacional, quer dos países visitados, quer dos países dos perpetradores desses actos, mesmo quando são praticados fora deles”.
A ética nas Viagens e Turismo, não se deve limitar às questões de práticas sexuais ilegais e condenáveis. Todos aqueles que as não praticam, têm um dever de denúncia junto das autoridades ou das organizações não governamentais que, no terreno, lutam contra a miséria e a degradação moral das populações locais. Ser um turista responsável é, também, olhar para o tamanho da sua pegada ecológica, e para as consequências ambientais da sua passagem. É saber respeitar a cultura, os usos, as tradições, a história, as religiões e a língua dos países visitados. É saber valorizar os produtos locais, adquirindo-os e consumindo-os, e assim contribuir de forma saudável, para ajudar a minorar os efeitos do sub-desenvolvimento. É promover a paz, não é explorar o sofrimento dos outros.
Infelizmente, o tráfico de seres humanos, e muito particularmente de mulheres e crianças, para alimentar a lascívia do sexo, não é um exclusivo do Brasil, mas está espalhado por todas as partes do mundo, numa intensidade directamente proporcional à miséria social a que está associado. A prostituição, designadamente, a prostituição forçada, muito particularmente, a prostituição forçada de menores, é hoje um dos negócios ilícitos mais prósperos do planeta, nas mãos de máfias organizadas, no extremo oriente, em África, como na própria Europa, às nossas portas. São crianças, ou jovens adolescentes, que começam por ser iniciadas ou vendidas pelos próprios familiares, ou que são raptadas pelas redes de engajadores, e introduzidas num mercado sórdido, que constitui um ultraje aos mais elementares direitos humanos. Dizem as Nações Unidas, que são mais de dois milhões de menores. A estimativa peca seguramente por defeito. A comunidade internacional começa a reagir. A União Europeia estuda a criação de um sistema de alerta rápido para o rapto de crianças, e a adopção de uma legislação penal extraterritorial contra a exploração sexual e tráfico de crianças, pedofilia e prostituição de menores. A IATA e a WTO têm tomado posições conjuntas de condenação destas práticas. A ECTAP (End Child Prostitution, Pornography and Trafficking in Children for Sexual Purposes), uma rede internacional de organizações e de cidadãos, tem sido incansável neste combate. Várias cadeias hoteleiras, com a Accor à cabeça, têm adoptado medidas internas de combate a este flagelo, que passam pela formação do pessoal, pela selecção restritiva dos prestadores de serviços, pela proibição absoluta de tais práticas nas suas instalações, pela denúncia dos abusos conhecidos, por campanhas de esclarecimento do seu código de conduta, muito especialmente dirigido aos seus próprios clientes. Eis um exemplo de coragem empresarial digno de elogio. Tal como em todas as actividades, também no sector do Turismo, também no nosso país, a esmagadora maioria dos seus agentes, são pessoas bem formadas civicamente. No século XIX, Portugal foi pioneiro na abolição da escravatura no mundo. Portugal não pode ser conivente com a neo-escravatura dos nossos dias.
Este assunto estará em discussão, num Congresso que decorrerá, significativamente, no Rio de Janeiro, em Novembro próximo. Portugal não pode estar ausente.
Deputado, Presidente da Subcomissão Parlamentar de Turismo
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